Feijão: Expectativa Da Safra Derruba Os Preços

            No último mês de 2001, os preços médios diários recebidos pelos produtores de feijão do Estado de São Paulo decresceram bastante, caindo para R$46,00 a saca de 60 quilos, contra R$52,67/sc do início de novembro. Mesmo assim, o nível de preços, entre os dias 7 de novembro e 7 de dezembro, está em média 24% acima do verificado no mesmo período de 2000, tendo sido notado aumento de até 39% em alguns dias. Com esse nível de preços, a receita por saca proporciona ainda uma margem de lucro aos produtores, depois de descontado o custo operacional de produção. Porém, causa preocupação a evolução futura dos preços até o final da safra, que no Estado se encerra no final de janeiro (figura 1).

 ChartObject Figura 1 - Preços Médios Diários Recebidos pelos Produtores do Estado de São Paulo, em Novembro e Dezembro, 2000 e 2001


            Os preços médios diários recebidos pelos produtores são um pouco melhores que a média estadual no Escritório de Desenvolvimento Regional (EDR) de Itapeva, principal região produtora da safra das águas de feijão, ao lado dos EDRs de Avaré e Itapetininga, mas o comportamento é semelhante ao acima descrito. Enquanto no atacado da cidade de São Paulo o carioquinha tipo 1 voltou a subir após o dia 27 de novembro, para os produtores do EDR de Itapeva os preços ficaram estáveis em R$48,00/sc, aumentando consequentemente a margem dos atacadistas no mesmo período.
            Um fato conhecido no mercado de feijão é o aumento da demanda do atacado no final de cada mês (em torno do dia 25), em função da maior procura dos supermercados, que preferem ter as gôndolas abastecidas na virada do mês. O aumento citado, a partir do dia 27, no atacado, talvez possa ser explicado por esse fato. Por outro lado, pode refletir, também, a escassez do produto de melhor qualidade no mercado. Apesar da entrada da safra nova, com cerca de 30% da área colhida até novembro, o volume de grãos novos na Bolsa de Cereais de São Paulo é aparentemente muito pequeno. Há também notícias de compradores do norte e nordeste do País, regiões que têm plantio tardio na primeira safra, negociando diretamente nas regiões produtoras (figura 2).

ChartObject Figura 2 - Preços Médios Diários Recebidos pelos Produtores no EDR de Itapeva, Preço Modal do Carioquinha Tipo 1 no Atacado da Cidade de São Paulo e a margem de comercialização 
            Na Bolsa de Cereais, o abastecimento, desde primeiro de novembro, ocorreu basicamente com produto proveniente do próprio Estado, além de Argentina e Minas Gerais e um pouco de Goiás, até 29/11/01. A origem paulista variou de 67% a 81%, indicando que a colheita ainda não atingiu a plena safra. Nota-se também a presença do produto do Paraná, grande fornecedor, só que a partir de 6 de dezembro, cuja safra têm calendário semelhante ao paulista (figura 3).

ChartObject Figura 3 - Oferta de Feijão no Bolsa de Cereais da Cidade de São Paulo, por Origem, Novembro e Dezembro de 2001 
            A pergunta que surge é: qual será o comportamento do mercado paulista até o final da safra das águas? São Paulo, pelo fato de ser o maior mercado consumidor de feijão, com cerca de 20% do consumo nacional, e não ser o maior produtor (ficando em torno de quinto lugar em termos nacionais), depende em maior ou menor grau da produção de fora do Estado. Do mesmo modo, alguns estados produtores, como os do norte ou do nordeste, dependem em algumas épocas do ano da produção do sul, sudeste ou centro-oeste e do próprio Estado de São Paulo.
            Esse fluxo da produção em termos nacionais faz com que o mercado, e consequentemente o preço de feijão, tenha reflexo, não só da produção local ou regional como também do conjunto da produção nacional. Assim, o preço de feijão no Estado de São Paulo não só é um indicador para o resto do mercado brasileiro, mas também é reflexo da produção do resto do país. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), ao divulgar, em outubro, o aumento da primeira safra de feijão 2001/02 no País, da ordem de 19,3% a 21,1%, sinalizou provável excesso de oferta no mercado de feijão, pelo menos até fevereiro/março de 2002, quando se encerra a primeira safra em termos nacionais. O preço no mercado nacional não caiu de imediato ao anúncio porque era época de entressafra, mas o recado foi dado.
            Não bastasse essa situação conjuntural, um fator agravante pode afetar os produtores em 2002. A estimativa de outubro indica também uma provável superprodução para a produção nacional no ano agrícola 2001/02, mesmo que não haja nenhum aumento de área na segunda e na terceira safras próximas, com previsão de 3,10 milhões a 3,17 milhões de toneladas, contra 2,59 milhões de 2000/01 (crescimento anual de 20%). Esse resultado vai depender muito da produtividade da segunda e terceira safras, que nem se iniciaram. Portanto, vai depender das condições climáticas, que na maioria dos casos estão fora do controle humano, exceto a terceira safra que é irrigada.
            Caso essas previsões se confirmem, os produtores de feijão no País passarão por maus momentos, principalmente nos meses em que ocorrem a sobreposição da colheita da primeira e segunda safras, entre fevereiro e março. Além disso, o anúncio da grande oferta pode afetar o mercado antes de sua ocorrência, puxando os preços para baixo.
            Nos últimos oito anos, foi constatado que o consumo per capita de feijão do brasileiro está decrescendo devido a fatores como mudança nos hábitos alimentares, mudança no estilo de vida, com mais refeições fora do lar, e substituição por outras fontes de proteína como ovos ou frango. Nesses anos, o País não conseguiu escoar a produção anual acima de 3 milhões de toneladas sem que houvesse um decréscimo mais que proporcional nos preços, durante alguns meses do pico da safra. Os produtores paulistas não esquecem que, entre os meses de fevereiro e março de 2000 (ano em que a produção nacional foi acima de 3 milhões de toneladas), os preços recebidos variaram entre R$30,00 e R$35,00 a saca, mal tangenciando o custo operacional de produção. Tudo isso indica que o mercado brasileiro de feijão não comporta mais uma produção nacional anual acima de 3 milhões de toneladas.
            A elasticidade-renda de feijão, medida tanto em termos de despesas com o produto como em termos de consumo físico, estimada por Rodolfo Hoffmann1 para as grandes metrópoles brasileiras, apresentou sinal negativo. Isto é, para o aumento percentual de renda ocorre diminuição percentual no consumo de feijão, em ambas as medições, quando não se considera estrato de renda familiar. Considerando o estrato de renda familiar, um grupo intermediário - nem muito pobres nem muito ricos - apresentou elasticidade-renda de feijão positiva, quer dizer, aumenta-se o consumo de feijão com o aumento da renda, mas no cômputo geral os brasileiros diminuem o consumo de feijão quando ocorre aumento da renda familiar. O aumento do consumo per capita de feijão no Brasil, além do crescimento vegetativo, somente poderá ocorrer quando os consumidores perceberem um atrativo a mais relacionado à qualidade do alimento.
            O regime de chuvas no sudeste do Estado de São Paulo, principal região produtora de feijão das águas, foi normal a próximo do normal de agosto a outubro. Em novembro, choveu bem menos que a média histórica, o que, se favoreceu a colheita, prejudicou as culturas em desenvolvimento (florescimento e frutificação). Nas regiões produtoras de Bahia e Minas Gerais, choveu bem em setembro, com cerca de 150 a 200 mm (tabela 1).

Tabela 1- Precipitação e anomalia de Precipitação, nas Regiões Produtoras do Sudeste do Estado de São Paulo e dos Estados da Bahia e Minas Gerais.

  Sudeste de São Paulo  Bahia e Minas Gerais
Ago. Quanto Choveu: 50~100 mm

Anomalia: +50mm 

Quanto choveu: 25 a 50 mm

Anomalia: Normal

Set. Quanto choveu: 100 mm

Anomalia: -50 mm 

Quanto choveu: 25 a 50 mm.

Anomalia: Normal

Out. Quanto choveu: 200 mm

Anomalia: +50 a +100 mm

Quanto choveu: 100 a 150 mm

Anomalia: Quase Normal 

Nov. Quanto choveu: 50 a 100 mm

Anomalia: - 150 a –100 mm

Quanto choveu: 150 a 200 mm

Anomalia: +50 a +100 mm

               Fonte: Elaborado com base nos dados do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPETEC).

            Em 07/12/01, o estoque governamental (AGF e Contrato de Opção) de feijão era zero. As perspectivas para o final de dezembro e início do ano novo são de retração no consumo de feijão, como acontece tradicionalmente. Os produtores de feijão do Estado de São Paulo devem avaliar bem o mercado, antes do início da safra de feijão da seca, cujo plantio se inicia em janeiro, para maximizar o seu lucro e minimizar o prejuízo.
 
 

1Os trabalhos são: 
Elasticidades-Renda das Despesas com Alimentos em Regiões Metropolitanas do Brasil em 1995-96, publicada em Informações Econômicas, SP, v.30, n.2, p.17-24, fev. 2000; e
Elasticidades-Renda das Despesas e do Consumo Físico de Alimentos no Brasil Metropolitano em 1995-96, publicada em Agricultura em São Paulo, SP, v.47, n.1, p.111-122, 2000.
 

 

Data de Publicação: 01/12/2001

Autor(es): Ikuyo Kiyuna Consulte outros textos deste autor