Café: 2003, um ano para se esquecer

            O mercado internacional de café praticamente não apresentou mudanças expressivas nas cotações em 2003. A variação nas cotações da segunda posição apresentou um acumulado de 8,85% para os cafés tipo arábica na BM&F; de -1,41% para o contrato C na Bolsa de Nova Iorque; de -9,06% para os tipo robusta na Bolsa de Londres; e de 1,60% para o preço composto divulgado pela Organização Internacional do Café (OIC). Assim, neste ano, o mercado manteve a tendência de flutuações, sem sair do lugar, mesmo com a menor oferta brasileira de cafés arábicas, que resultou em menores embarques no segundo semestre (gráfico 1).

Gráfico 1 - Cotações médias mensais do café em diferentes mercados de futuros, 2001 a 2003

                   Fonte: Gazeta Mercantil

            Em dezembro, observou-se ligeira reação no mercado do produto, mas sem nenhuma mudança espetacular na tendência predominante. Assim, nesse mês, no mercado de Nova Iorque, o preço médio do café arábica (Contrato C, segunda posição de março de 2004) teve alta de 3,56%; no mercado de robusta da Bolsa de Londres (cotação para março de 2004), o aumento no preço chegou a 5,56%, enquanto na BM&F o arábica atingiu crescimento de 3,09%. Em função das altas observadas, o preço composto diário da OIC apresentou elevação de 5,46% (gráfico 1).
            A diferença das cotações entre a BM&F e a Bolsa de Nova Iorque, que tinha atingido menos US$ 21,62 por saca em dezembro de 2002, reduziu-se para US$ 14,70/saca no mesmo mês de 2003, revelando aumento da competição entre os exportadores com significativa diminuição de suas margens de comercialização.
            A instabilidade observada no mercado internacional de cafés arábicas na Bolsa de Nova Iorque para as cotações de março de 2004, negociados em dezembro de 2003, indica tendência de alta no preço para o setor. Provavelmente, o mercado deverá definir uma tendência futura de preços para o produto, somente após a melhor definição da oferta mundial para o ano-safra 2003/04 (gráfico 2).

Gráfico 2 - Cotações diárias em dezembro na Bolsa de Nova Iorque, para café arábica, Contrato C, Março de 2004

                            Fonte: Gazeta Mercantil

            Para o cafeicultor, 2003 não entusiasmou. Notadamente no caso paulista, o preço médio de R$ 178 por saca de 60 kg, que o produtor recebia em dezembro de 2002, caiu 5,44% no mesmo mês de 2003, quando atingiu R$ 168,38/saca. Isto indica que o mercado foi totalmente desfavorável ao cafeicultor, num ano em que se estima um incremento nos custos de produção da ordem de 15 a 20%.
            Ainda em dezembro, no entanto, o cafeicultor brasileiro obteve recuperação no preço da ordem de 2,17%. Isso foi reflexo da pequena alta das cotações no mercado internacional, que porém foi retida em parte pela valorização do real (2,04%) (gráfico 3).

Gráfico 3 - Preços médios mensais recebidos pelos produtores de café no Estado de São Paulo, no período de 2000 a 2003

                       Fonte: Instituto de Economia Agrícola 


Um balanço das exportações

            O Conselho dos Exportadores de Café (CECAFE)1 divulgou os números relativos às exportações brasileiras do produto. Ao serem comparados com os dados de 2002 (ano civil), evidenciam importante incremento nas receitas cambiais (11,9%), com relativa diminuição dos volumes embarcados (-9,2%), refletindo a melhoria do valor pago pelos cafés brasileiros.
            Em 2003, foi animador o resultado das exportações de café torrado e moído, que apresentaram expansão de quase 90% frente ao ano anterior, embora tenha havido uma redução de 3,6% nos volumes embarcados. Os esforços, tanto públicos (APEX, SEBRAE, etc.) quanto privados (empresas, associações e sindicatos), deverão continuar contribuindo para um crescimento bastante significativo das exportações de café torrado e moído, robustecendo ainda mais esse importante agronegócio.

TABELA 1 - Volume e valor das exportações brasileiras de café, 2002 e 2003

Item
Robusta
Arábica
Verde
T&M
Solúvel
Total
Volume em 1.000 sc de 60 kg
Jan.-dez 2002
4.298.582
21.292.787
25.591.369
66.650
2.546.537
28.137.906
Jan.-dez. 2003
2.724.179
19.996.799
22.720.978
64.239
2.823.046
25.544.024
Receita em US$ 1.000
Jan.-dez. 2002
127.595
1.056.113
1.183.708
3.878
179.205
1.366.791
Jan.-dez. 2003
114.783
1.183.137
1.297.920
7.351
223.645
1.528.916
Fonte: Elaborada a partir de dados básicos do CECAFE e da ABICS

            As expectativas para as exportações de café em 2004 continuam otimistas, não tanto pelos volumes que serão embarcados, para os quais se espera inclusive uma ligeira redução, mas principalmente pelo valor dos produtos transacionados internacionalmente. As duas primeiras semanas de janeiro já começam a antecipar essa provável tendência. Esse fato pode contribuir na minimização da crise de preços pela qual tem passado o segmento, notadamente os cafeicultores, pois, como é de conhecimento público, cerca de 90% da cotação nas bolsas internacionais são transmitidos para os cafeicultores.

Oferta mundial

            A previsão do departamento de agricultura estadunidense (USDA)2 aponta para uma substancial diminuição da oferta mundial de café na safra 2003/04 (tabela 2). Tal queda reflete os seguidos anos de crise pelos quais tem passado o segmento em todo o mundo e que impediram os produtores de efetuar os necessários tratos culturais exigidos pelas lavouras.

TABELA 2 – Estimativa da produção mundial, e por regiões, de café para os anos-safra 2002/03 e 2003/04
(em milhões de sacas)

Região
Safra 2002/03
Safra 2003/04
América do Norte
16.773
17.049
América do Sul
67.175
50.232
África
14.598
14.831
Ásia e Oceania
24.213
25.017
Total mundial
122.759
107.129
Fonte: USDA

            Espera-se que surjam novas previsões, tanto do USDA quanto de outros importantes institutos, apontando maiores quebras do que a já divulgada. Tais estatísticas passaram a compor as estratégias dos principais grupos empresariais atuantes no segmento, o que nos permite antever um ano com maiores promessas de preços em patamares remuneradores aos cafeicultores.

Novas políticas públicas

            Ainda em janeiro, o Governo Federal deverá definir diretrizes de políticas a serem implementadas para o ano-safra de café 2004/05. Esse conjunto de ações terá por base pauta elaborada por técnicos e representantes do segmento e apreciada pelo Conselho Deliberativo da Política do Café (CDPC).
            A utilização dos recursos do Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (FUNCAFE) na equalização das taxas de juros para os empréstimos destinados ao segmento é sem dúvida uma das sugestões de maior relevância. Outros programas como o Moderfrota, elaborados sob essa mesma modalidade de gestão financeira, robusteceram o segmento de máquinas agrícolas. Portanto, é possível que também venham a otimizar a cafeicultura.
            A dificuldade desse tipo de proposta consiste na absorção dos passivos existentes. Sabe-se que a carteira de empréstimos com recursos do Funcafé possui elevado grau de inadimplência, mesmo após as seguidas renegociações e prorrogações. A implementação de nova modalidade de empréstimos somente seria aceitável após uma radical operação de saneamento das contas credoras do Funcafé e o estabelecimento de gestores capazes de garantir no longo prazo a capitalização e liquidez do fundo.
            Os industriais, por seu turno, buscam igualmente algumas vantagens para seus segmentos. Recursos às mesmas taxas cobradas dos cafeicultores para a aquisição e estocagem de café, além de maiores facilidades para a compra de produto dos estoques governamentais, são demandas presentes na pauta a ser debatida.
            Obviamente, o Governo Federal não terá condições de prover o setor em todas as suas demandas. A reedição dos contratos de opção e dos empréstimos para estocagem sem opção de venda é medida que certamente comporá as diretrizes de políticas para a atual safra.
            Afora tais ações, há pouca margem de manobra, pois cresce nos demais setores pertencentes ao agronegócio relativa desconfiança quanto às reais necessidades dos cafeicultores e industriais dessas políticas específicas para o produto. Desse ponto de vista, devem ser mais incentivadas as ações orientadas à criação de novos negócios (como é o caso da exportação de torrado e moído) e às pautadas pela excelência do produto junto ao mercado interno, arrefecendo todas as demais que impliquem repasse de recursos para os agentes privados, como é o caso dos recursos para equalização das taxas de juros.

1 CACAFE: www.cecafe.com.br
2 USDA: www.usda.gov

Data de Publicação: 16/01/2004

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Nelson Batista Martin (nbmartin@uol.com.br) Consulte outros textos deste autor