Agronegócios paulistas: indicadores de P&D e do desempenho setorial

            A opinião pública, de maneira quase unânime, destaca o papel estratégico das inovações tecnológicas para o processo de transformação decorrente do desenvolvimento econômico. Na atual quadra da economia brasileira, é importante verificar o patamar dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D), dado o inexorável da relevância da pesquisa pública paulista e brasileira para a construção do patamar atual de competitividade das cadeias de produção dos agronegócios.
            A qualidade das contribuições institucionais deve ser medida pela amplitude das transformações que ajudou a produzir no sistema produtivo na qual está inserida. No caso dos agronegócios paulistas, elas foram substantivas, tendo como base a estrutura atualmente consolidada na Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA)¹.
            No período 1999-2003, a síntese dos indicadores econômicos dos agronegócios (tabela 1) mostra a força do dinamismo setorial.

  • O valor da produção da agropecuária paulista aumentou 34,63%, de R$ 18,4 bilhões para R$ 24,7 bilhões em valores constantes de 2003, mostrando o enorme crescimento da renda setorial.
  • A evolução do valor da produção agropecuária mostra inequívoca desconcentração regional, com o crescimento maior nas regiões fora do eixo Anhanguera-Bandeirantes, que contempla a região de melhores indicadores sociais e econômicos do Estado de São Paulo.
  • As sete regiões de abrangência dos pólos regionais da APTA, com crescimento superior à média estadual de 34,64%, foram Alta Paulista (57,84%), Alta Mogiana (51,84%), Sudoeste Paulista (50,07%), Alta Sorocabana (48,66%), Extremo Oeste (40,96%), Vale do Paraíba (39,84%) e Centro Oeste (38,72%); todas elas fora do epicentro Anhanguera-Bandeirantes.
  • As demais oito regiões de abrangência tiveram crescimento menor que a média estadual, mas superior aos 13,13 % verificados para o das sedes localizadas no eixo Anhanguera-Bandeirantes, ou seja, Médio Paranapanema (34,51%), Centro Sul (30,98%), Centro Leste (30,32%), Centro Norte (29,86%), Nordeste Paulista (29,55%), Leste Paulista (29,06%), Nordeste Paulista (19,13%) e Vale do Ribeira (18,12%) (tabelas 1 e 2).
  • As exportações dos agronegócios paulistas cresceram 21,9%, de U$S 6,3 bilhões para R$ 7,7 bilhões, fazendo de São Paulo a maior plataforma exportadora dos agronegócios brasileiros.
  • As importações dos agronegócios paulistas diminuíram 16,3%, de US$ 3,7 bilhões para US$ 3,1 bilhões, numa criterioso e sustentável processo de substituição de importações.
  • O saldo comercial da balança comercial dos agronegócios paulistas aumentou 77,5%, saltando de US$ 2,6 bilhões para US$ 4,6 bilhões, tornando a economia paulista superavitária ao cobrir o déficit comercial dos demais setores.
  • A pauta de exportações dos agronegócios paulistas mostra crescimento substantivo dos produtos manufaturados, de US$ 1,8 bilhão para US$ 4,7 bilhões (tabela 2), que em termos proporcionais significa evoluir de 28,2% das exportações setoriais para 60,7% das vendas setoriais; isto evidencia importante mudança qualitativa nas exportações setoriais pela agregação de valor, com São Paulo deixando de ser primário exportador para ser agroindustrial exportador nos agronegócios, gerando renda e emprego internos.

Tabela 1 - Síntese dos indicadores dos agronegócios paulistas (1), 1999-2003

Variáveis
1999
2000
2001
2002
2003
Valor da Produção
18.372.028
19.658.236
21.748.522
24.129.507
24.735.144
Exportações 
6.288.061
5.530.292
6.196.287
6.536.950
7.666.649
Importações 
3.723.300
3.739.710
3.550.965
3.005.949
3.115.128
Saldo Comercial
2.564.761
1.790.582
2.645.322
3.531.001
4.551.521
(1) valor da produção em R$ 1000 médios de 2003 e comércio exterior em US$ 1000.
Fonte: IEA/APTA.

Tabela 2 - Síntese das exportações dos agronegócios paulistas, em US$ mil, 1999-2003

Perfil de Produtos
1999
2000
2001
2002
2003
Básicos 
2.112.080
1.421.010
1.133.029
1.315.425
1.645.089
Semimanufaturados
2.402.061
2.255.928
1.150.735
1.104.171
1.367.040
Manufaturados
1.773.920
1.853.354
3.912.523
4.117.354
4.654.520
Total
6.288.061
5.530.292
6.196.287
6.536.950
7.666.649
Fonte: APTA.

            A síntese dos investimentos em P&D, consubstanciada nos orçamentos da APTA para o período 1999-2003, mostra, entretanto, preocupante estagnação dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento para os agronegócios pelo Governo do Estado de São Paulo.

  • O orçamento total em valores constantes de 2003 cresceu de R$ 98,3 milhões em 1999 para R$ 117,0 milhões no biênio 2000-2001, recuando para R$ 101,3 milhões em 2003.
  • O orçamento reflete de forma direta os dispêndios com recursos humanos, que cresceram de R$ 68,1 milhões em 1999 para R$ 78,7 milhões em 2000, reduzindo de forma persistente até atingir R$ 64,0 milhões em 2003, na fase mais aguda da recente crise fiscal brasileira dados os limites legais impostos para dispêndios totais com pessoal.
  • As despesas operacionais totais evoluíram de R$ 30,2 milhões em 1999 para R$ 40,1 milhões em 2001 e recuaram para o patamar de R$ 37,3 milhões em 2003, também refletindo de forma nítida a crise econômica e fiscal do biênio 2002-2003.
  • Os dispêndios operacionais com recursos aplicados pelo Tesouro do Estado, após crescerem de R$ 15,9 milhões em 1999 para R$ 19,7 milhões em 2000, recua para R$ 13,5 milhões em 2003, num reflexo direto do aperto das contas públicas no biênio 2002-2003.
  • As captações de recursos com base em parcerias, institucionais e público-privadas, evoluíram de R$ 14,3 milhões para R$ 23,7 milhões; assim, a participação dessas parcerias no dispêndio operacional total passou de 47,5% no início do período para 63,7% no final do período.

Tabela 3 - Síntese dos investimentos em P&D dos agronegócios paulistas, 1999-2003

Ítens (1)
1999
2000
2001
2002
2003
Operacionais Tesouro
15.862.629
19.684.137
18.033.468
13.638.386
13.544.631
Operacionais Parcerias
14.340.587
18.629.281
22.057.627
22.320.115
23.742.495
Operacionais Totais
30.203.216
38.313.418
40.091.095
35.958.501
37.287.126
Pessoal Tesouro 
68.063.539
78.689.274
77.022.709
72.277.514
63.966.191
Tesouro Total
83.926.168
98.373.411
95.056.177
85.915.900
77.510.822
Orçamento Total
98.266.755
117.002.692
117.113.804
108.236.015
101.253.317
(1) Em R$, valores constantes de 2003.
Fonte: APTA.

            A síntese de produção de bens e serviços decorre de processo de aprimoramento gerencial capaz de produzir resultados importantes, como fruto do esforço institucional centrado na sua programação de P&D (tabelas 4 e 5).

  • As análises laboratoriais para certificação de qualidade, fundamentais para as exportações dos agronegócios paulistas, aumentaram 165,2%, de 188,2 mil em 1999 para 499,2 mil em 2003.
  • A produção de sementes básicas, importante para a multiplicação dos resultados de pesquisa e sua internalização no sistema produtivo, cresceu 57,75%, de 578,4 toneladas para 912,3 t.
  • O número anual de inovações tecnológicas, representando resultados incorporados ao processo produtivo, cresceu de 86 em1999 para 161 em 2003.
  • O número de atendimentos diretos evoluiu 27,5%, de 32,4 mil para 41,4 mil no período.
  • O atendimento eletrônico, implantado em 1999, passou de 150,1 mil em 2000 para 475,2 mil em 2003, democratizando o acesso a informações em tempo real.
  • O número de pessoas treinadas em inúmeros eventos para transferência do conhecimento aumentou 132,97%, de 20,5 mil pessoas para 47,9 mil pessoas, contribuindo com a maior eficiência e produtividade setorial.
  • O número anual de pesquisas em andamento cresceu de 935 para 1.283, com a ampliação da ação institucional que atende aos grandes grupos de cadeias de produção; destaque para os vegetais para exportação (cana, café e laranja) e a proteína animal (carne bovina, leite, suínos, carne de frango e ovos).

Tabela 4.- Síntese da transferência do conhecimento, APTA, 1999 a 2003

Item
1999
2000
2001
2002
2003
Análises laboratoriais (n°)
188.192
235.722
242.526
499.167
Sementes Básicas (kg)
578.432
634.329
728.000
813.000
912.320
Inovações Tecnológicas (n°)
86
85
97
121
161
Atendimentos Diretos (n°)
32.450
32.202
35.987
38.367
41.386
Atendimentos eletrônicos (n°)
-
150.133
301.578
364.114
475.210
Pessoas Treinadas(n°)
20.545
24.664
28.645
47.858
FONTE: APTA

Tabela 5.- Síntese da geração do conhecimento, APTA, 1999 a 2003

Programas
1999
2000
2001
2002
2003
Agroexportação
176
213
217
195
267
Grãos e Fibras
160
159
151
150
157
Proteína Animal
136
183
193
202
218
Agronegócios Especiais
140
208
203
168
167
Horticultura de Mesa
134
146
171
159
183
Infra-estrutura dos Agronegócios
50
78
101
109
104
Ocupação do Espaço
49
81
85
84
99
Agronegócio Familiar
37
40
46
42
38
Políticas Públicas
53
58
60
56
50
TOTAL
935
1.166
1.227
1.165
1.283
FONTE: APTA

            A crise fiscal, resultante do esgotamento do padrão de financiamento do setor público - ainda não solucionado - e da estagnação econômica recente, exige a estruturação de mecanismos que ampliem a capacidade de geração de inovações da pesquisa, com investimento compatível com o crescimento da renda setorial. Sem isso, o desempenho institucional pode estar comprometido.
            O processo de formatação do novo padrão de financiamento do setor público, com base nas leis de parceria público-privadas e de inovação tecnológica - ambas desenvolvidas nos planos estaduais e federal – apresenta desafios na continuidade da mudança institucional. A premissa para esse sucesso exige a transformação do atual regime jurídico da APTA, sujeito aos preceitos da Administração Direta, porque ele incompatível com a institucionalidade que está sendo definida.
            A transformação da APTA em entidade pública autárquica, dotando-a de personalidade jurídica própria e de patrimônio próprio, é crucial para estruturar mecanismos consistentes de:

  • gestão de direitos de propriedade intelectual, estimados em R$ 30 milhões anuais a preços de março de 2004; cria fonte adicional de receitas para financiar as despesas correntes e os investimentos;
  • parceria público-privada para a geração e multiplicação de inovações, em especial com o acesso, em parceria com empresas paulistas, a recursos competitivos das agências de fomento e dos fundos setoriais; viabiliza a captação de recursos em volume maior do que o atual dada a maior agilidade operacional;
  • parceria público-privada para o estabelecimento de incubadoras de novos negócios, com a gênese e o desenvolvimento de empresas de base tecnológica e empreendimentos inovadores de empresas já estabelecidas; permite a atuação por meio do uso por prazo determinado, mediante cessão onerosa e participação nos resultados, da infra-estrutura laboratorial e experimental da Agência;
  • parceria público-privada para a realização de feiras de negócios tecnológicos nos moldes da Agrishow Ribeirão Preto, que geram renda e emprego no território paulista; é interessante para estimular esse processo de formatação de feiras menores em vários pontos do Estado de São Paulo, com base nos 15 Pólos Regionais de Desenvolvimento Tecnológico dos Agronegócios.

            O novo regime jurídico da APTA, consubstanciado em instrumento legislativo apropriado, na verdade consiste no cumprimento do dispositivo da Constituição Federal, representado pelo Parágrafo 2° do artigo 207, que confere à APTA, enquanto instituição de pesquisa científica e tecnológica, flexibilidades operacionais similares àquelas de que dispõem as universidades públicas paulistas por força do mesmo artigo constitucional.
            Essa maior agilidade operacional permitirá que a APTA desenvolva toda a sua potencialidade institucional. No âmbito da pesquisa científica e tecnológica do governo paulista, face às especificidades constitucionais e legais, não basta uma lei de inovações tecnológicas para dinamizar instituições como a APTA. É preciso ir além.

1 A Agência Paulista de Tecnologia Dos Agronegócios (APTA), com base na LC 895 de 14 de maio de 2001 e no Decreto 46.488 de 8 de janeiro de 2002, consolidou-se no período 1999-2003 como a instituição de pesquisa científica e tecnológica da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Governo do Estado de São Paulo.

Data de Publicação: 05/11/2004

Autor(es): José Sidnei Gonçalves (sydy@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor