Decreto permite articulação entre ensinos médio e técnico

            A partir de 2005, 'os estudantes brasileiros poderão cursar disciplinas do ensino médio junto com disciplina    s do ensino técnico. Esta possibilidade foi assegurada pelo Decreto 5.154', publicado dia 26 de julho, 'regulamentando quatro artigos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996. O decreto prevê várias alternativas de articulação entre o ensino médio e o ensino técnico de nível médio, sendo a principal delas a integração entre ambos, que resgata a chance dos estudantes saírem desta fase do ensino já com qualificação profissional para disputar uma oportunidade no mercado de trabalho'1.
            A reforma definida pelo decreto anterior separou o ensino médio do técnico. Por exemplo, o aluno cursaria o ensino médio de manhã e um curso técnico à tarde ou à noite, em escolas diferentes. Ou então, tinham de concluir o ensino médio para só depois ingressar em um processo de profissionalização1.
            Tanto o decreto revogado quanto o aprovado visaram facilitar e agilizar a formação, ampliando as funções da escola e permitindo que as instituições e os jovens escolham o caminho mais adequado para a sua realidade. A grande diferença, especialmente levando em consideração os resultados da pesquisa realizada pelo IEA2, está na concepção do que vem a ser o foco principal dessa agilização.
            O modelo anterior buscou grande agilidade, mas falhou ao impor a desvinculação do ensino médio, num contexto em que as escolas técnicas estavam obtendo bons resultados na formação dos jovens, por se preocupar com uma sólida formação básica concomitante ao preparo deles para o mercado de trabalho.
            Assim, a partir de 2005, cada escola 'decidirá se quer unir ou manter separados o ensino médio do ensino técnico de nível médio. E cada estudante decidirá se quer fazer só o ensino médio ou se quer seguir uma das outras três opções de articulação do ensino médio ao ensino técnico de nível médio: na mesma escola e com a mesma grade curricular, em escolas diferentes e em grades diferentes ou, então, após a sua formação no segundo grau'1.
            'Neste aspecto, o estudante poderá escolher entre usar o ensino médio como trampolim para a universidade ou para o mercado de trabalho, graças à qualificação técnica de nível médio adquirida'1.
            Segundo o Ministério da Educação (MEC), a 'integração do ensino médio com o ensino técnico de nível técnico resgata um modelo que já existia no País e que foi extinto em 1997 pelo decreto 2.208, contrariando a recém-criada LDB de 1996'1.

Necessidade de rearticulação

            O IEA, em parceria com a Fundação SEADE, realizou, em 2003, estudo de mercado de trabalho para o técnico agropecuário no Estado de São Paulo2. O estudo comprovou a necessidade do Programa de Expansão da Educação Profissional (PROEP), efetivado pelo MEC, desde que houvesse ratificação de algumas de suas diretrizes. A principal delas é a necessidade de articulação entre os ensinos médio e técnico, o que foi contemplado pelo Decreto aprovado.
            O trabalho realizado mostrou que as medidas legais em vigor tiveram grande impacto nas escolas flexibilizando e ampliando a oferta de cursos. No entanto, a formação do técnico de nível médio nos moldes anteriores foi considerada bastante adequada às grandes empresas entrevistadas e às perspectivas de ascensão social dos alunos formados, mesmo quando trabalham em área diversa de sua formação.
            Grande parte dos entrevistados expressou preocupação com a qualidade do ensino agrotécnico. Além da necessidade de adaptar as tecnologias às condições regionais e àquelas específicas do produtor ou grupo de produtores, o técnico deve ser capaz de adaptar-se às inovações que ocorrem a velocidade crescente.
            Assim, faz-se necessária uma formação básica sólida, de forma que o profissional conheça os princípios básicos que regem as tecnologias para estar apto a adaptá-las e adaptar-se. A partir das entrevistas realizadas, pode-se dizer que a adaptação da educação profissional a demandas imediatas do mercado, bem como à difusão de tecnologias modernas, não responde à demanda do próprio mercado para o profissional técnico de nível médio.

Aspectos positivos

            Não se deve, no entanto, minimizar a importância do Proep, que estimulou grande discussão sobre o tema, levantando a necessidade de ampliação e flexibilização dos cursos de nível básico (qualificação e reprofissionalização independente de escolaridade prévia), bem como da reciclagem de profissionais de todos os níveis, além do estímulo à maior integração com a comunidade local.
            Tais resultados foram considerados bastante positivos, devendo-se, no entanto, evitar a expectativa excessiva quanto ao papel da escola na região (PETTI et al., 2004). A integração da escola com produtores, empresas, ONGs e órgãos governamentais pode ser considerada um excelente método de ensino, mas não é papel da escola substituir a assistência técnica e os centros de pesquisa. Outro cuidado a ser destacado é a forma como a escola encara essa integração. Frente à insuficiência dos recursos destinados para custeio e à defasagem salarial dos professores – que resultou no recente movimento grevista –, a parceria como uma nova fonte de recursos de custeio e investimento não pode ocorrer em detrimento dos objetivos básicos e primordiais da escola3.
            Aspectos positivos da reforma do ensino técnico do governo anterior poderão ser aprimorados com o Decreto aprovado. A educação profissional será desenvolvida por meio de cursos e programas em três níveis: 1) formação inicial e continuada de trabalhadores; 2) educação profissional de nível médio; e 3) educação profissional tecnológica de graduação e pós-graduação.
            Assim, a Qualificação para o Trabalho já estava contemplada pelo decreto anterior. A inovação está em articular os cursos e programas de formação inicial e continuada de trabalhadores com cursos de educação de jovens e adultos, objetivando não apenas a qualificação para o trabalho mas também a elevação do nível de escolaridade do trabalhador1. Esta inovação, inclusive, responde às demandas do mercado de trabalho por um profissional com formação básica sólida.

1MEC: http://www.mec.gov.br. Acessado em 26/07/2004.
2 Projeto 'Estudos de mercado de trabalho como subsídios para a reforma da educação profissional no estado de São Paulo', desenvolvido em 2003 em parceria com a Fundação Seade, no âmbito do PROEP (recursos do MEC, Fundo de Amparo ao Trabalhador-FAT e Banco Interamericano de Desenvolvimento-BID).
3 À medida que as parcerias se transformam na principal fonte de recursos das escolas, a prioridade pela educação cidadã acaba sendo substituída pelas prioridades das fontes financiadoras.

Data de Publicação: 25/11/2004

Autor(es): Regina Helena Varella Petti Consulte outros textos deste autor
Denyse Chabaribery (denyse.chabaribery@gmail.com) Consulte outros textos deste autor