Perspectivas Para A Demanda De Algodão E De Fibras Sintéticas

            O mercado mundial de algodão tem sido caracterizado pela fraca evolução do consumo a níveis inferiores aos do suprimento (estoque inicial mais produção). Para a atual safra 2001/02, é prevista a oferta de 29,6 milhões de toneladas, resultante principalmente de produção recorde de 21,0 milhões de toneladas. Por sua vez, o consumo deve manter a tendência decrescente e ficar em 19,7 milhões de toneladas, conforme o Comitê Consultivo Internacional do Algodão (ICAC) (tabela 1).

TABELA 1 – Projeção de oferta e demanda mundial de algodão, 2001/02 a 2005/061
(1.000t)
Item
2001/02
2002/03
2003/042
2004/05
2005/06
Estoque inicial
8,7
10,0
8,8
8,5
8,2
Produção
21,0
19,1
20,1
20,2
20,4
Oferta
29,6
29,1
28,9
28,8
28,6
Consumo
19,7
20,0
20,4
20,6
20,8
Exportações
6,1
6,3
6,4
6,4
6,4
Estoque final
10,0
9,1
8,5
8,2
7,8

1 Ano comercial de agosto a julho.
2 A diferença entre o estoque final da safra 2002/03 e o inicial de 2003/04 decorre das próprias publicações consultadas.
Fonte: Comitê Consultivo Internacional do Algodão (ICAC).

            Esse descompasso entre a oferta e a demanda de algodão, aliado à redução do ritmo de expansão econômica durante 2001, conduziu o mercado a registrar as mais baixas cotações, desde a década de 70. Na atual temporada, o elevado excedente, de 10 milhões de toneladas, deverá dificultar ainda mais uma reação mais significativa nos níveis de preços (figura 1).
            No que diz respeito à evolução da produção e exportação, o destaque são os Estados Unidos, onde, a despeito das baixas cotações internacionais, a produção de algodão não deixou de crescer, devendo bater novo recorde e alcançar 4,4 milhões de toneladas. Tradicionalmente, os Estados Unidos são os maiores exportadores e nesta safra deverão destinar ao mercado 2,1 milhões de toneladas, 41% a mais do que no ano passado, e ampliar ainda mais a sua representatividade no comércio, que passaria de 24% para 34% das exportações mundiais. Ressalta-se ainda que, mesmo se os americanos disponibilizarem essa grande quantidade, o excedente estadunidense, da ordem de 2,0 milhões de toneladas, ainda deverá ser muito elevado, pois corresponde ao dobro do nível médio em estoque dos últimos quatro anos.
            Assim, no curto prazo, o panorama que se vislumbra para o algodão não é dos mais animadores, sem a perspectiva de aumento correspondente no consumo. Além disso, há o fato de que, ao contrário de outras commodities agrícolas, não apresenta curta durabilidade e necessidade de reposição imediata, como no caso de alimentos. Mais ainda, os efeitos da política de subsídios nos Estados Unidos (maiores exportadores) constituem um agravante na medida em que isolam o país de quaisquer impactos decorrentes de queda das cotações internacionais, favorecendo constantes aumentos de produção e elevados excedentes exportáveis. A inversão desse quadro, e portanto a melhoria das condições de mercado, só seria factível se ocorresse uma quebra de safra. Não há, no entanto, até o momento indicações de que tal fato venha a ocorrer.
            As projeções realizadas pelo ICAC, para o período de 2002/03 a 2005/06, indicam que a oferta mundial de algodão deverá apresentar tendência decrescente, ao passo que a sustentação do crescimento no consumo é que deverá determinar as reduções nos excedentes (tabela 1).
            No caso do Brasil, as previsões do ICAC apontam para a expansão no consumo das atuais 900,0 mil toneladas para 990,0 mil toneladas em 2005/06. Dado que as produções de algodão e de têxteis são voltadas principalmente para o mercado doméstico, em virtude da fraca participação brasileira nas exportações mundiais da matéria-prima e de manufaturados, considera-se que as tendências sociais internas devam exercer expressiva influência sobre a demanda desses produtos.

Algodão versus fibras sintéticas

            As fibras utilizadas pela indústria têxtil dividem-se, basicamente, em três categorias1: naturais, artificiais e sintéticas. No âmbito da produção de manufaturados, o algodão enfrenta a concorrência principalmente das sintéticas, cuja participação relativa no consumo total de fibras vem aumentando desde a sua criação na primeira metade do século XX. Na medida do desenvolvimento de suas aplicações, as fibras sintéticas tornaram-se uma necessidade em função de dois fatores: o crescimento populacional, que passou a exigir maior rapidez a custos mais baixos para o atendimento da demanda por vestuários, e a redução da vulnerabilidade da indústria têxtil às possíveis dificuldades da produção agrícola. O poliéster é a mais consumida e a mais barata das fibras, sejam químicas ou naturais2. Assim, o algodão tem maior instabilidade nos preços, o que constitui um fator determinante na concorrência com as fibras sintéticas, cujas cotações são mais fáceis de serem previstas3.
            No período de 1995 a 2000, a participação do algodão no consumo global de fibras têxteis mostrou-se decrescente, de 37% para 33%, enquanto a das fibras sintéticas evoluiu de 45% para 53%4.
            No Brasil, a par da inserção do país na dinâmica mundial no sentido da intensificação do uso de fibras não-naturais a partir da década de setenta5, o algodão mantém sua hegemonia, representando 64,0% do consumo industrial de fibras contra 34,0% do das sintéticas, em 2001.
            A perspectiva de aumento no consumo das fibras sintéticas no mundo tem como principais fatores o crescimento do setor automobilístico, a expansão do mercado de produtos de uso doméstico, como tapetes, cortinas e carpetes nos países em desenvolvimento, e a maior sofisticação do vestuário. Cabe, no entanto, destacar que o algodão não deve ter seu consumo reduzido, mas sim que o aumento no uso das sintéticas tende a ser mais intenso6. Visto que a fibra de algodão apresenta múltiplas e variadas aplicações, proporcionando aos tecidos características dificilmente imitáveis7, pode-se inferir que o algodão deverá, pelo menos, manter sua posição na demanda mundial de fibras têxteis, tendência que poderá refletir-se no Brasil.
 

1 Além do algodão as demais fibras naturais são: lã, juta, linho, rami e seda; as artificiais compreendem as derivadas de celulose e; as sintéticas, provenientes da petroquímica, como o poliéster. 
2 ROMERO, L. L. et al. Fibras artificiais e sintéticas.  BNDES, Relato Setorial, Rio de Janeiro, p.55-66,  junho, 1995.
3 NOGUEIRA JUNIOR, S. Relação preço-qualidade e procura de algodão em pluma. IEA, SP. Relatório de pesquisa, 11/80.
4 Conforme dados de Fiber Organon, divulgados pela Associação Brasileira da Indústria Têxtil (ABIT).
www.abit.org.br, em 19/4/02.
5 OLIVEIRA, M. H. Principais matérias-primas utilizadas na indústria têxtil. BNDES Setorial, Rio de Janeiro,  n.5, março, 1997. 
http://www.bndes.gov.br/publica/setor_old.htm, em 31/8/00.
6 SCHMID, H. Brasil tem assento no conselho da ITMF. Revista Textília Têxteis Interamericanos, SP, n. 39, p.2-12, jan./fev./mar., 2001. Entrevista concedida a Márcia Mariano.
7 GRIDI-PAPP, I. et al. Manual do produtor de algodão. São Paulo: BM&F, 1992.

Data de Publicação: 04/06/2002

Autor(es): Marisa Zeferino (marisa.zeferino@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor