Mercado futuro de boi gordo: o maior crescimento entre os derivativos agropecuários

            Os negócios com boi gordo na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F) cresceram 98,50% em 2004, o melhor desempenho entre os derivativos agropecuários negociados no ano, atingindo o total de 225.200 contratos (gráfico 1). Já o número de contratos negociados no período de janeiro a abril de 2005, apesar das dificuldades enfrentadas pelo setor – derivadas do excesso de oferta e preços em declínio conquanto as exportações se mantivessem crescentes-, atingiu 73.412, um aumento de 47,90% em relação ao primeiro quadrimestre de 2004. Esse resultado indica o dinamismo deste do setor, cuja evolução na BM&F se mantém à frente de outros produtos.

            Gráfico 1. Evolução anual dos contratos negociados de Boi Gordo na BM&F, 2000-05 (1)

(1) cada contrato equivale a 330 arrobas                                  Fonte:http://www.bmf.com.br/2004/pages/imprensa1/relatorios/RelMensal/RelatorioMensal_Abril2005.pdf  

            Mesmo com tal crescimento, o total de negócios na Bolsa representou, em 2004, 4,52 milhões de cabeças prontas para o abate, o equivalente a 18% dos machos abatidos no ano ou 10% do total anual de abate de bovinos no Brasil. Essa pequena participação indica o potencial de crescimento deste mercado no futuro (gráfico 2).
            Ao analisar o número de contratos negociados mensalmente, nos últimos três anos, verifica-se que, em 2005, se tem um crescimento mais expressivo dos negócios realizados (gráfico 3).
            O desempenho de contratos negociados teve também importante influência da evolução no número de animais acabados em confinamento e em semiconfinamento, cuja quantidade de cabeças terminadas aumentou 18% em 2004, com a expectativa de que cresça 12% em 20051.

Gráfico 2. Evolução anual dos contratos negociados de Boi Gordo na BM&F em equivalente ao número de cabeças para o abate, 2000-05 (1)

(1) cada contrato equivale a 330 arrobas
Fonte:http://www.bmf.com.br/2004/pages/imprensa1/relatorios/RelMensal/RelatorioMensal_Abril2005.pdf
 

            Gráfico 3. Evolução mensal dos contratos negociados de Boi Gordo na BM&F, 2003-05 (1)

(1) cada contrato equivale a 330 arrobas
Fonte:http://www.bmf.com.br/2004/pages/imprensa1/relatorios/RelMensal/RelatorioMensal_Abril2005.pdf 
  

            O comportamento do mercado de boi gordo em 2004 na BM&F, para a segunda posição, mostra queda de 10,20% no ano. Nos últimos seis meses, até abril, essa queda foi de 13,90%, sinalizando excesso de oferta, derivado das incertezas geradas pela saída do mercado de frigoríficos importantes e da seca que ocorreu no início do ano, afetando a produção pecuária de parte do Centro Oeste, do Sudeste e de toda a região Sul. Isto obrigou os produtores a antecipar suas vendas e a descartar matrizes e novilhas, gerando uma oferta que não está sendo absorvida pelas exportações e por um fraco mercado de consumo interno. O resultado é a ocorrência de fortes quedas de preços aos produtores. Neste contexto, apenas os pecuaristas que fizeram hedge, no final de 2004, estão conseguindo maior remuneração para o boi (gráfico 4).

Gráfico 4. Preços médios mensais recebidos pelos produtores de boi gordo no Estado de São Paulo, 2002-05

Fonte: Instituto de Economia Agrícola.

            Assim, inúmeros produtores que fixaram em novembro preço de R$ 65,00 a arroba, na BM&F, receberam esse preço em abril, ao contrário dos demais que tiveram de se contentar, nas diferentes praças paulistas, com preços da ordem de R$ 54,00 a arroba. Portanto, neste mercado baixista e incerto do boi gordo, apenas os pecuaristas que fizeram posições na BM&F, no final de 2004, estão conseguindo uma remuneração mais favorável para o seu produto.
            Além disso, o agravamento do ambiente de incerteza provocada pela desvalorização do dólar - o real valorizou-se em cerca de 14% nos últimos seis meses, afetando a receita dos exportadores de carne bovina - favoreceu, por um lado, a necessidade de hedge da moeda americana pelos exportadores e, por outro, a entrada desses agentes na BM&F, em busca de garantia da matéria-prima por um dado preço de mercado.
            O ano de 2004 constituiu-se num período de aprendizado em relação ao mercado futuro, sobretudo para muitos frigoríficos, com o objetivo de gerenciamento de riscos por meio dos instrumentos do mercado futuro. Para o exportador, não basta apenas prevenir-se na ponta da compra do boi gordo, mas é preciso também se assegurar na venda de dólar, de maneira a evitar prejuízos causados pela volatilidade do câmbio. Com isso, avançou-se no conceito de que, mais importante do que o valor final do produto em si, interessa trabalhar com a margem de lucro planejada. Para isso, mais empresas e pecuaristas montaram mesa de operações e contrataram profissionais para atuar nesta área. Tanto que, no caso das empresas exportadoras, se organizaram departamentos financeiros responsáveis por essas operações.
            Ao analisar a distribuição dos contratos em aberto por tipo de participante, verifica-se que, na posição de comprado (COMPRA), se destacam os investidores pessoa jurídica não-financeira, caracterizados por frigoríficos e indústria de processamento de carnes, principalmente os exportadores, que procuram fixar antecipadamente o preço de referência para sua matéria prima, no caso o boi gordo e/ou seus produtos. Em janeiro de 2004, cerca de 80,12% dos contratos estavam concentrados nesses participantes. Nesta mesma posição, cabe destacar a partir de julho a participação de pessoas físicas atuando como comprados, constituindo-se em investidores cujo objetivo é obter maior retorno que o oferecido por outras aplicações financeiras (tabela 1).

Tabela 1.- Distribuição dos Contratos de Boi Gordo em Aberto por Tipo de Participante, 2004-05 (1) (em percentagem)
 

Item
jan/04
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov 
Dez
jan/05
Fev
Mar
Abr
COMPRA
P. Jurídica Financeira
0,08
0,00
0,00
0,81
1,73
2,64
2,47
4,05
1,64
0,03
0,01
0,00
0,22
1,50
1,13
0,62
Invest. Institucionais
Invest. Instituc. Nacional
3,19
7,95
6,08
5,61
0,12
0,57
1,07
3,20
3,00
2,70
1,42
2,24
12,44
13,16
12,24
12,87
Invest. Instituc. Estrangeiro
0,70
2,57
2,22
1,64
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
4,75
4,88
4,48
4,64
Invest. Não Residente - Agro
0,21
0,15
0,18
0,00
0,00
1,86
0,00
0,34
8,36
5,86
6,45
12,51
5,94
4,27
1,97
2,65
P. Jurídica Não Financeira
80,12
74,62
73,05
61,19
69,51
73,04
58,36
55,34
55,21
57,77
60,22
34,83
34,84
51,58
55,43
48,41
Pessoa Física
15,70
14,71
18,47
30,75
28,64
21,89
38,10
37,07
31,79
33,64
31,90
50,42
41,81
24,61
24,75
30,81
Total (%)
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
Total (n.º de contratos)
5.137
7.513
11.421
13.088
9.100
8.043
7.543
7.658
11.730
11.711
12.492
8.391
2.235
10.254
11.362
10.963
VENDA
P. Jurídica Financeira
0,00
0,13
0,09
0,08
1,38
2,83
4,30
3,43
2,34
0,50
0,15
0,18
0,72
0,04
0,80
0,30
Invest. Institucionais
Invest. Instituc. Nacional
4,93
5,63
3,67
5,24
3,25
3,43
4,19
6,23
5,03
3,27
2,46
2,50
3,28
2,10
2,56
1,59
Invest. Não Residente - Agro
1,73
1,32
0,08
2,13
10,74
2,18
0,00
0,09
7,85
8,90
7,55
12,53
2,12
4,26
2,00
2,23
P. Jurídica Não Financeira
30,76
24,12
28,10
24,77
34,90
29,80
25,63
33,18
32,96
34,80
38,38
28,13
44,06
38,88
31,01
61,54
Pessoa Física
62,58
68,80
68,06
67,78
49,73
61,76
65,88
57,07
51,82
52,53
51,46
56,66
49,82
54,72
63,63
34,34
Total (%)
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
100,00
Total (n.º de contratos)
5.137
7.513
11.421
13.088
9.100
8.043
7.543
7.658
11.730
11.711
12.492
8.391
2.235
10.254
11.362
10.963

(1)Dados referentes ao último dia de pregão do mês
Fonte:
http://www.bmf.com.br/2004/pages/imprensa1/relatorios/RelMensal/RelatorioMensal_Abril2005.pdf
 

            Quanto à posição de vendido (VENDA), o destaque é o de participantes pessoas físicas - os produtores de boi gordo, especialmente os confinadores e semiconfinadores - que, por conhecer com maior precisão os seus custos, procuram fixar um preço de venda quando iniciam o fechamento do gado nos meses de abril, maio e junho, garantindo uma margem de lucro prefixada, envolvendo pelo menos 50% dos animais em engorda. Assim, nesta categoria de pessoa física, na posição de vendido, em geral concentram mais de 50 % dos contratos em aberto, com exceção de abril de 2005, provavelmente devido à forte tendência de queda das cotações do boi gordo no mercado do físico e de futuros. A segunda categoria que se destaca são as pessoas jurídicas não-financeiras, constituídas por frigoríficos e indústria de processamento, que atuam principalmente nas mudanças de posição, de acordo com o comportamento das cotações manifestadas no mercado futuro, com o objetivo de otimizar seus retornos, em função da evolução das cotações verificas no mercado futuro do boi gordo (tabela 1).
            A solidificação e a ampliação da condição brasileira de liderança mundial no mercado de carne bovina, em termos de volume exportado, correspondem à necessidade de ensejar esforço crescente para diferenciar seus produtos visando incorporar maior valor agregado aos produtos e processos. A continuidade da expansão das exportações de carne bovina brasileira vai exigir a melhoria de eficiência e profissionalização, não apenas da indústria exportadora como também de toda cadeia de produção de carne bovina . Nesse caso, os exportadores e os produtores mais tecnificados deverão utilizar, de forma crescente, as ferramentas financeiras do mercado futuro - como instrumento de proteção patrimonial e de suporte à procura de maior estabilidade de renda na atividade-, bem como de diferentes inovações tecnológicas na concretização de maior competitividade da carne bovina brasileira no mercado interno e internacional. 2

_________________________

1Instituto FNP, Boletim Pecuário Semanal, n.o 606 de 5 de maio de 2005. São Paulo - SP

2 Artigo registrado no CCTC-IEA sob número HP-40/2005.

Data de Publicação: 31/05/2005

Autor(es): Nelson Batista Martin (nbmartin@uol.com.br) Consulte outros textos deste autor
Luiza Maria Capanema Bezerra (luizamcb@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor