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Agricultura Urbana E Peri-urbana – Questões E Perspectivas

            Questões como a fome e a pobreza de grande parcela da população mundial - e os caminhos de resistência, de luta pela sobrevivência, que têm sido historicamente buscados pelas classes pobres de todo o mundo - são as raízes de um debate bastante atual sobre o papel da agricultura urbana (AU).
            A produção agrícola em torno dos grandes centros urbanos, voltada geralmente para o abastecimento de produtos hortícolas, tem ganhado uma nova dimensão, ligada a questões bastante diversas da tradicional que é o abastecimento do mercado urbano, das classes sociais que podem pagar por uma dieta alimentar rica e variada.
            Este trabalho buscou fazer uma breve revisão sobre o desenvolvimento da AU e suas implicações. As preocupações que se fazem presentes na atual discussão desse tema estão relacionadas a questões sociais como saúde, acesso à alimentação para as classes sociais pobres e de baixa renda e iniciativas de comunidades para minorar o problema alimentar; questões econômicas como o desemprego e a desigualdade de distribuição de renda; e questões ambientais relacionadas com poluição da água e do ar, perda e contaminação de solo.
            Os problemas sociais, que são geralmente associados ao desenvolvimento da agricultura urbana e peri-urbana (AUP) em países com maior grau de desigualdade social como é o caso do Brasil, estão intrinsecamente ligados aos econômicos, derivam da necessidade prática da sobrevivência física. Em países ricos e com melhores índices de distribuição de renda, a AUP pode ser uma opção de sustentabilidade.
            A criação de ocupação e renda, e conseqüente melhoria de qualidade de vida dos cidadãos envolvidos com a AU, é a grande contribuição econômica desta agricultura, que pode ainda aumentar os recursos nas comunidades mediante agregação de renda, seja esta obtida por meio de venda direta da produção para a população moradora nos entornos da comunidade, seja através de algum pré-processamento, como a produção de compotas. Para isso, o processo educativo é fundamental, englobando desde noções básicas de higiene até noções de produção, comercialização, processamento e gerenciamento.
            Entre as questões que envolvem a AUP, a FAO tem fomentado discussões acerca da sustentabilidade do meio ambiente urbano para a sociedade relacionadas com estas atividades.
            Com base na literatura e em projeto-piloto que está sendo desenvolvido na Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA), chamado de 'Projeto Quintal'2, que inclui implantação de hortas urbanas na Bacia do Alto Tietê (composta totalmente por municípios da Região Metropolitana de São Paulo), consideramos importante analisar as possíveis conseqüências de políticas destinadas a apoiar a AU e a AUP.
            Para que a AU seja uma opção na geração de ocupação e renda, é necessário que haja terra, espaço disponível para o cultivo, o que requer um entendimento e postura política frente à importância dessa atividade. Além disso, a reciclagem de lixo, principalmente orgânico, precisa ser incentivada nas comunidades, propiciando um acréscimo de nutrientes para a produção da AUP.
            É necessário ainda um sério trabalho de extensão direcionado para responder às demandas específicas da AU, considerando fortemente seus aspectos sociais e ambientais, disponibilizando à população técnicas e conhecimentos que garantam a produção com segurança e a qualidade dos alimentos. Estas medidas podem ainda resultar na melhoria da qualidade da terra e longevidade do ecossistema urbano.
            A educação do público local sobre a viabilidade e vantagens do sistema de produção de alimentos, além de apoiar a AU, ainda possibilita estimular as pessoas a um consumo mais saudável de alimentos.
            É fundamental, portanto, uma política que considere a importância e o potencial da AUP para a solução de alguns problemas sociais, econômicos e ambientais. A concessão de crédito específico para esta atividade é um requisito importante para a sua viabilidade.
            A implantação de áreas-piloto do 'Projeto Quintal', através das dificuldades levantadas, indica e reforça as necessidades que estamos apresentando. Mesmo que seja ainda recente a implantação desse projeto para se realizar uma avaliação ampla, seus indicadores estão sendo construídos e apontam para resultados que envolvem, desde a retenção de solo (melhorando a qualidade de vida da população vizinha de uma horta, onde não há mais fortes enxurradas carregada de lama), até a qualidade de vida da população3 que está ocupada no projeto.
            Entendemos então que o interesse e as necessidades dos atores sociais, aliados às conseqüências de políticas destinadas a apoiar a agricultura urbana e peri-urbana, podem minimizar seus riscos, maximizar os benefícios e garantir um aumento de rentabilidade para a população de classe pobre já envolvida ou que venha a se dedicar a estas atividades. As possibilidades de geração de trabalho e renda para as classes sociais pobres indicam a grande contribuição de uma atuação que viabilize e potencialize a agricultura urbana, principalmente em países com alta concentração de renda.



1Este trabalho, na íntegra se encontra na comissão editorial da revista Informações Econômicas, publicada mensalmente pelo Instituto de Economia Agrícola.
2Esse projeto está sendo realizado através de parceria entre a Secretaria de Agricultura e Abastecimento e a Secretaria de Emprego e Relações de Trabalho do Estado de São Paulo.
3A população envolvida no projeto recebe treinamento em gestão, adequado para o sub-projeto do qual participa.
  Geógrafa, Mestre, Pesquisador do Instituto de Economia Agrícola. Amonteiro@iea.sp.gov.br

Data de Publicação: 08/04/2002

Autor(es): Ana Victoria Vieira Martins Monteiro (ana.monteiro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor