Algodão: preços internacionais em recuperação e retração no consumo brasileiro

            As cotações de algodão no mercado internacional recuperam-se no decorrer da temporada 2002/03, depois de atingir, na safra anterior, os menores níveis das duas últimas décadas. O Índice A de Liverpool, que alcança US$61,20 cents/libra-peso neste início do ano-safra 2003/04, é o mais elevado patamar dos últimos vinte e quatro meses (figura 1).
            Para essa reação das cotações, contribuíram a redução de 11% na produção, a qual totalizou 19,14 milhões de toneladas, e o crescimento no consumo, para 20,96 milhões de toneladas (3,8%) em 2002/03. O resultado é o declínio de 17% nos estoques e a reversão da tendência crescente desse item do suprimento mundial, segundo o ICAC – Comitê Consultivo Internacional do Algodão1.

Figura 1 – Cotações internacionais de algodão, Índice A de Liverpool, agosto de 2001 a agosto de 2003

            Para 2003/04, é esperado crescimento de 7% na produção mundial de algodão, que deverá alcançar 20,49 milhões de toneladas. No entanto, a oferta deve decrescer ligeiramente (em 1,6%) e totalizar 29,31 milhões de toneladas, tendo em vista a redução nos estoques iniciais da safra.
            O consumo previsto, de 21,23 milhões de toneladas, deve ser apenas 1,3% superior ao da temporada passada por conta do enfraquecimento do ritmo de utilização da fibra nos países industrializados. De todo modo, pelo segundo ano consecutivo, o consumo deve superar a produção.
            Assim, o Índice A de Liverpool deve atingir, em média, US$61,00 cents/libra-peso na safra 2003/04, patamar 9,5% acima da safra que ora finda, conforme o ICAC. Esse nível de preços, entretanto, ainda deve permanecer abaixo da média dos últimos 25 anos, de US$72,00 cents/libra-peso2.
            As causas do recente declínio das cotações internacionais de algodão não podem ser atribuídas exclusivamente às condições da oferta e demanda do produto, em virtude da forte influência exercida pela concessão de subsídios governamentais à produção e à exportação. De acordo com estudo realizado pelo ICAC, a eliminação de todos os subsídios redundaria em aumento de US$31,00 cents/libra-peso sobre os atuais preços do algodão no mercado mundial2.
            No Brasil, a produção de algodão em pluma deve ser 850,8 mil toneladas, na safra 2002/03, com aumento de 11% em comparação com a anterior, graças ao crescimento de 12,3% na produtividade, haja vista a moderada redução de 1,1% na área cultivada. Entre os estados produtores, destaca-se a Bahia com ganho de 29,1% na produtividade média, onde a produção de algodão foi elevada em 58,6%, reafirmando a posição do Estado como terceiro maior produtor nacional. Em Mato Grosso e em Goiás, as produtividades cresceram 10,8% e 8,2%, respectivamente, conforme a CONAB - Companhia Nacional de Abastecimento 3.
            A transferência da maior parte da produção para os Cerrados e a reconversão da atividade nas regiões produtoras mais tradicionais constituem-se nas principais bases da atual cotonicultura no país, gerando condições para a obtenção de uma das mais elevadas produtividades médias do mundo. Para 2003/04, o ICAC4 prevê que a produtividade brasileira deva ser de 1.077 quilos por hectare de algodão em pluma, superando as obtidas em grandes nações produtoras e com larga margem a média mundial, de 635kg/ha.
            Um aspecto a ser destacado no balanço de oferta e demanda de algodão no Brasil é o aumento de 68,7% nas exportações, as quais devem chegar a 185 mil toneladas. Por outro lado, o consumo interno, mesmo sendo a principal matéria-prima da indústria têxtil nacional, vem decrescendo durante os últimos três anos. Para 2003, este consumo está estimado em 720 mil toneladas (-10,5%), o menor desde 1992, conforme a CONAB. Para isso, vem contribuindo não apenas a intensificação do uso das fibras sintéticas, principais concorrentes do algodão, como também o quadro econômico, uma vez que a demanda por têxteis e vestuário depende do poder aquisitivo da população5.
            Não obstante o quadro interno, as importações devem ser ampliadas em 92% e alcançar 130 mil toneladas (figura 2). Os preços relativamente baixos no mercado internacional e a recomposição dos estoques internos, em virtude da maior quantidade a ser destinada ao exterior, possivelmente justificam as maiores internalizações do produto. Desse modo, o estoque final deve ser ampliado em 79,6% e totalizar 171 mil toneladas.

Figura 2 – Oferta e demanda de algodão em pluma, Brasil, 1999 a 2003

            Quanto às possibilidades de ampliação da produção de têxteis para exportação, os produtos brasileiros deverão enfrentar: a) até 2005, as cotas previstas pelo ATV - Acordo de Têxteis e Vestuário 6; b) os regimes especiais de comércio no âmbito do NAFTA - Acordo de Livre Comércio da América do Norte, destino da maior parcela das exportações7; e c) tarifas de importações dos produtos da cadeia produtiva de têxteis/confecções maiores quando comparadas a outras manufaturas, nos países desenvolvidos8.
            Mesmo assim, é importante salientar que as exportações brasileiras de têxteis de algodão apresentaram crescimento de 22,3% no primeiro semestre de 2003, em comparação com o mesmo período do ano passado9.

1 ICAC: www.icac.org
2 CAMPOS, A.G.de L. Causas e consequências da crise internacional de preços do algodão. http://www.cottonnews.com.br.
3 CONAB: www.conab.gov.br
4 Cotton: Review of the world situation. Washington, ICAC, v.56, n.4, mar-apr, 2003.
5 SOARES, P.M. Abertura comercial: setor têxtil por um fio – avaliação dos impactos do processo de abertura comercial sobre o setor têxtil e as estratégias de adaptação. Dissertação de Mestrado, FGV, SP, 1994.
6 BARBOSA, M.Z.; BESSA JÚNIOR, A.A. Panorama do mercado mundial de têxteis e vestuário. www.iea.sp.gov.br.
7 Nesse sistema, fios e tecidos estadunidenses são exportados para o México e, também, para outros países da América Central para a confecção de tecidos e roupas, e exportados de volta aos Estados Unidos, sob acordos mais flexíveis e com tarifas preferenciais. BARBOSA, R.A. Barreiras aos produtos e serviços brasileiros. Embaixada do Brasil, Washington, D.C. Outubro de 2002. http://mdic.gov.br/publica/SECEX/doc/barreiras.PDF.
8 PROCHNIK, V. O impactos dos acordos comerciais. Revista Textília, SP, n. 48, p.10-12, abr./maio/jun. 2003.
9 VICENTE, J.R. et al. Balança comercial dos agronegócios no primeiro semestre de 2003. www.iea.sp.gov.br.

Data de Publicação: 28/08/2003

Autor(es): Marisa Zeferino (marisa.zeferino@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor