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Café: qual o futuro?
                                 Entre 
1997 e 1998, era fácil prever o que poderia acontecer três anos depois com o 
mercado de café. Permanece vivo em nossa memória um evento ocorrido em Salvador 
(BA), quando, na ocasião, alertávamos aos participantes para que procurassem se 
preparar para um período de cotações extremamente desfavoráveis que estava por 
vir, já que o preço em vigor na época, de mais de R$350,00 a saca (valor de 
hoje), não poderia perdurar. Na ocasião, um líder do setor manifestou-se dizendo 
que, apesar do nosso alerta, esperava que os presentes guardassem o seu produto 
para que pudesse ser vendido pelo dobro do preço que até então vigorava.  Perspectivas de curto prazo               Ao se 
analisar a situação atual, observa-se que os valores, em dólar, estão bem abaixo 
dos valores de 1992. Mas em termos de reais a cotação média do café em 2002, 
pior ano do presente ciclo de baixa, estava 16% acima do valor de 1992, o que 
pode ser atribuído principalmente à desvalorização da nossa moeda. Graças a 
isso, e também às medidas de apoio ao setor e a maior profissionalização dos 
produtores, não houve e não haverá erradicação à semelhança do que ocorrera em 
1992. Casos pontuais contudo continuarão a ocorrer.  1 CONAB: www.conab.gov.br 
  2 OIC www.ico.org 
 
            
Obviamente que se tal previsão de alta se confirmasse, isso seria um desastre 
para toda a cafeicultura, pois redundaria em uma taxa de crescimento anual da 
produção bem superior aos 3% estimados a partir de 1994. Isso superaria por 
longa margem o crescimento da demanda, verificado no mesmo período, forçando uma 
baixa de preços até superior àquela realmente ocorrida. 
            
Gostaríamos de fazer um parênteses antes de continuar a análise. Em 1985/86, o 
preço do café chegou a ser vendido a US$ 400/sc (câmbio da época), tendo como 
pretexto os problemas de seca ocorridos naquele período. Quando os preços 
começaram a cair para US$ 350-US$300/sc, muitos cafeicultores deixaram de 
entregar o produto, aconselhados por algumas lideranças, na expectativa de que 
voltassem para aqueles patamares. Resultado: acabaram vendendo o café a US$40 em 
1992! Essa digressão ao passado se faz necessária, apenas para lembrar aos 
produtores de café sobre a importância de se ter uma visão global do seu 
negócio, pois aqueles que acompanhavam a evolução do varejo americano sabiam que 
era impossível que os preços internos permanecessem naqueles níveis elevados. 
 
            
Mas voltemos à situação de hoje. Ao lado da discussão/controvérsia quanto aos 
dados de consumo, produção e estoques mundiais de café (já que os dados não 
fecham quando se faz a comparação com as informações disponíveis, levando os 
analistas a suspeitar de que ou os dados de consumo estão subestimados ou que os 
dados de produção estejam superestimados), o que mais preocupa os produtores no 
momento é se existe ainda alguma esperança para o setor de café. No auge da 
crise do ciclo passado (1992/93), foram erradicados mais de 1 milhão de hectares 
de café, decisão essa apontada como a principal causa do déficit de produção em 
relação ao consumo até 1997, fato agravado ainda com a geada de 1994.  
            Apesar dessa situação mais favorável, em relação ao passado, certamente não vamos ter em 2004 produção maior que a de 2002. A esse respeito, chegamos até a discordar de algumas declarações oficiais, de que o Brasil produziria, em 2004, cerca de 55 milhões de sacas (depois revisadas), volume esse bem superior ao estimado para 2002 pela Companhia Nacional de Abastecimento – CONAB 1 (48 milhões) e, ainda mais, acima do número das 
fontes mais otimistas do setor privado (50 milhões). Acreditamos que o eventual 
aumento de área produtiva não deverá compensar a diminuição da produção em 
função dos relaxamentos nos tratos culturais (em decorrência dos preços baixos), 
do seu abandono e do clima desfavorável em algumas regiões. 
            
Mesmo que um número oficial da próxima safra só possa ser conhecido quando a 
CONAB divulgar o seu levantamento, isso não impede que se faça algumas 
especulações sobre o que poderá ser o volume da safra brasileira de 2004. Como 
foi mencionado, existe controvérsia quanto aos dados estatísticos. Os dados de 
produção mundial de 2002 têm variado de 118 a 122 milhões de sacas; os de 2003, 
entre 100 e 105 milhões de sacas, mas aparentemente há consenso de que a 
produção de 2001 teria sido da ordem de 110 milhões de sacas. Assim, se se 
considerar as duas estimativas mais divulgadas para 2002 (118 milhões e 122 
milhões de sacas), os aumentos de produção em relação a 2001 (110 milhões) 
seriam de 7,3% e 10,9%, respectivamente. 
            
Dadas as considerações feitas no decorrer deste artigo relativas a dificuldades 
no setor, e considerando como defensáveis os números de produção apresentados no 
parágrafo anterior, não podemos aceitar como resultado a estimativa de produção 
de 116 milhões de sacas para 2004, obtido pela aplicação da maior taxa de 
crescimento (10,9%). Da mesma forma, no extremo oposto, não seria possível 
admitir que se obtenha em 2004 uma produção inferior aos 110 milhões de 2001. 
 
            Tendo em vista essas ponderações, pode-se admitir como aceitável que a produção mundial de 2004 fique na faixa de 110 a 115 milhões de sacas, mais próxima, talvez, do limite inferior. Consideremos que o consumo mundial de café possa ficar entre os limites de 113 milhões e114 milhões de sacas (outras fontes estimam volumes maiores), bem maior do que as estimativas da Organização Internacional do Café (OIC) 2. Se isso ocorrer, 
iremos nos defrontar com uma situação em que a soma de dois anos seguidos de 
produção seja insuficiente para atender as necessidades de consumo (2003 e 
2004), déficit esse que ainda poderá ser coberto pelos estoques existentes nos 
países produtores e consumidores. 
            
A pior fase deste ciclo de baixa, como já mencionamos, ocorreu em 2002. Assim 
sendo, entendemos que estamos entrando numa fase de recuperação de mercado, 
comprovada pelo fato de que, mesmo desfavoráveis, os preços atuais estão mais de 
50% acima dos preços de setembro de 2002. A tendência dos preços é claramente 
ascendente, o que não impede entretanto que ocorram períodos de baixa, 
influenciados por movimentos especulativos, a exemplo do que ocorrera em 
1993/94. Os produtores têm que ficar muito atentos, pois uma produção maior, 
esperada para 2004, poderá servir de pretexto para a ação desses agentes no 
mercado. 
            
Mas é possível também que ocorra o contrário. Ou seja, como os negócios com café 
são também muito influenciados pelas expectativas, a sinalização de que teremos 
em 2005 uma produção talvez menor do que a de 2003 poderá ter efeitos 
antecipados e incorporados nas cotações de 2004.  
Data de Publicação: 11/09/2003
                Autor(es): 
                Luiz Moricochi (moricochi@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Sebastião Nogueira Junior (senior@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
 Consulte outros textos deste autor              
 
                    







 
                    
                        
