O Valor da Terra Nua no Estado de São Paulo e a Regulamentação da Cobrança do ITR – Instrução Normativa n. 1.562 RFB

A Secretaria da Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (SAA-SP) realiza levantamento em torno do valor da terra agrícola desde os anos 1970, em parceria estabelecida entre o Instituto de Economia Agrícola (IEA) e a Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI).

Ao longo desses anos, as informações provenientes desses levantamentos serviram de base para desapropriações realizadas pelo governo, instituições bancárias e cobrança de tributos ligados à Terra: Imposto de Transmissão de Causa Mortis e Doação (ITCMD), Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e mais recentemente o Imposto Territorial Rural (ITR).

O objetivo desse trabalho é, a partir do conhecimento dos preços praticados no mercado de agrícola paulista, esclarecer a situação provocada pela publicação pela Receita Federal da Instrução Normativa n. 1.562 (IN n. 1.562)1.

 

De 2011 a 2014, o valor médio da terra nua no Estado de São Paulo cresceu 62,5%. O aumento do valor da terra nesse período pode ser explicado pelos bons retornos proporcionados pelas grandes culturas, principalmente pelo avanço da área cultivada com cana--de-açúcar no estado.

De 2014 a 2015, o valor médio da terra nua no estado caiu 1,2%. Desde 1996/1997, durante a primeira crise do real, esses valores não haviam diminuído. A redução dos valores das terras do estado tem, como principal elemento para justificar, a crise econômica vivenciada nos últimos dois anos no país, em que a escassez de capital no mercado, aliada às incertezas causadas pelas variações climáticas em relação aos retornos proporcionados pela prática agrícola, fez com que a demanda por terra fosse reduzida.

Em 30 de abril de 2015, a Receita Federal publicou a IN n. 1.562, que dispõe sobre a prestação de informações sobre o valor da terra nua dos municípios à Secretaria da RFB, com a finalidade de utilização delas como referência para a cobrança do Imposto Territorial Rural (ITR).

A publicação da IN n. 1.562 facultou os municípios paulistas a utilizarem os valores da SAA-SP/IEA/CATI como parâmetro para declaração do ITR. Essa instrução foi redigida e publicada pela Receita Federal de forma totalmente independente, sem nenhum tipo de envolvimento das secretarias da agricultura estaduais ou seus órgãos técnicos, o que fez com que as instituições responsáveis pelo levantamento dos preços de terra se adaptassem à nova realidade sem nenhum tipo de discussão. O IEA desenvolveu treinamento para os responsáveis técnicos das regionais da CATI no preenchimento dos questionários referentes ao levantamento dos valores de terra nua, com o objetivo de promover um alinhamento metodológico entre as entidades envolvidas e alertar sobre a publicação da Instrução.

Os resultados do levantamento feito em novembro de 2015 demonstram que o treinamento realizado surtiu o efeito desejado e refletiu na melhora da qualidade das informações enviadas na grande maioria dos casos.

A publicação da Instrução Normativa deu origem às pressões sobre os enumeradores2 desse levantamento. Por um lado, algumas prefeituras têm interesse em que seus questionários sejam preenchidos com valores acima aos praticados no mercado, com o objetivo de aumentar a arrecadação com o ITR. Isso se deve porque, a partir de 2016, 100% da arrecadação do ITR retorna para o município - anteriormente 50% dos recursos eram destinados à União e 50% aos municípios.

Por outro lado, os produtores rurais, associações de produtores e cooperativas, ou os “pagadores” de ITR, pressionam os enumeradores para que os valores informados sejam inferiores aos praticados no mercado, possibilitando o pagamento de menores alíquotas.

Como consequência dessa situação, pode-se citar o exemplo relativo ao EDR de General Salgado, onde fortes interesses locais interferiram no preenchimento dos questionários, comprometendo a publicação dos valores de terra nua. Nesse escritório, todos os municípios informaram apenas os valores de terra para pastagem, e todos os municípios passaram o mesmo valor para essa categoria de uso do solo, muito abaixo aos observados na série histórica do IEA. 

 

Em novembro de 2015, todos os 21 municípios desta região informaram o valor de R$4.648,00 por hectare. Conforme a metodologia do levantamento, a depuração foi feita por meio de contato telefônico com o responsável pela coleta das informações, esclareceu ao instituto que, no caso em questão, os valores foram definidos com base em reunião entre os técnicos da CATI e representantes do setor produtivo. Ou seja, enquanto a metodologia determina que os enumeradores devam realizar pesquisa com os agentes do mercado imobiliário (corretores, imobiliárias, etc.) para obter informação referente ao valor de terra agrícola praticado no município, o EDR de General Salgado definiu esses valores com base em reunião, não respeitando a metodologia do levantamento.

Ao longo de sua história, a Secretaria da Agricultura e Abastecimento, por meio do IEA, sempre utilizou o método científico e o critério na execução de seus levantamentos estatísticos, primando pela qualidade das informações. Em consequência do desrespeito à metodologia do levantamento, os valores de terra do EDR de General Salgado não puderam ser publicados.

Concluindo, a crise econômica e política vivenciada nos últimos anos, em que há escassez de recursos financeiros tanto por parte das prefeituras quanto por parte dos produtores rurais, cria um cenário tenso, no qual cada agente tenta captar recursos ou recolher menores contribuições tributárias, alienando-se da responsabilidade com os outros envolvidos nessa equação.

O IEA, como órgão oficial do Estado de São Paulo, responsável por levantamentos estatísticos científicos do agronegócio paulista, tem como obrigação primar pela qualidade das informações produzidas, eliminando possíveis erros e apresentando a confiabilidade necessária à estrutura de Estado e às tributações competentes. A metodologia e o conhecimento do mercado de terras estão aliados cada vez mais às regulamentações sobre terras e seus tributos, marcando a importância da qualidade metodológica no processo dos levantamentos estatísticos. 

 

 

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1BRASIL. Instrução Normativa RFB n. 1.562, de 29 de abril de 2015. Dispõe sobre a prestação de informações sobre Valor da Terra Nua à Secretaria da Receita Federal do Brasil. Diário Oficial da União, Brasília, 30 abr. 2015. Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=63572&visao=
anotado> Acesso em: 15 mar. 2016.

 

2Enumerador é a nomenclatura dada aos técnicos que preenchem os questionários.

 

 

Palavras-chave: valor da terra nua, Imposto Territorial Rural, Receita Federal.


Data de Publicação: 13/05/2016

Autor(es): Felipe Pires de Camargo (fpcamargo@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor