Investimentos na Armazenagem de Grãos

            A importância que a produção de alimentos vem ganhando no mundo e o papel hoje representado pelos biocombustíveis têm colocado em evidência um segmento até pouco tempo considerado como co-adjuvante no agronegócio mundial - a armazenagem de grãos.

            Artigo publicado na Revista Word Grain (DONLEY, 2007)1 relaciona uma série de projetos recentes efetivados na área de estocagem de grãos em decorrência da safra mundial recorde obtida em 2007 e que superou em 5% a anterior. Esse fato provocou muitos negócios com silos e equipamentos em várias regiões do globo.

            Destaque maior cabe aos Estados Unidos pelo grande número de usinas de etanol de milho que à época somava 80 e que apresentou um aumento de 7,5 milhões de toneladas na capacidade de armazenagem de grãos, sobretudo nos grandes estados produtores do cereal (Corn Belt).

            Importantes investimentos em novas instalações e melhoramentos também foram feitos no México, Índia, Ásia e Europa Oriental, para atendimento de demandas específicas. No Brasil, a capacidade estática de armazenagem tem aumentado ano a ano, sobretudo nas propriedades rurais. O elevado custo dos empréstimos, porém, tem contido os investimentos.

            Aqui será feita uma comparação entre Brasil e Estados Unidos (EUA), dois grandes produtores de grãos, mas com condições distintas de clima e de infra-estrutura de armazenagem.

            Pelas condições climáticas do Hemisfério Norte, caracterizado por invernos rigorosos e ainda por questões de segurança, a armazenagem de alimentos sempre é considerada estratégica naquele país.

            O inverno rigoroso e a alta incidência de fenômenos climáticos adversos concomitantemente com o sistemático envolvimento do país em conflitos bélicos fazem com que haja acentuada preocupação com provisão de alimentos para consumo interno e atendimento das tropas. A propósito, muitos dos avanços tecnológicos no preparo de alimentos são devidos à sua utilização prática nos campos de batalha. Grande parte dos alimentos enlatados e desidratados surgiu dessa necessidade. Além disso, os EUA são os maiores exportadores do Mundo e apresentam um consumo fantástico de alimentos em comparação mesmo com os países mais desenvolvidos. Tudo lá é gigantesco e com os grãos não poderia ser diferente.

            O consumismo exagerado é uma marca do povo estadunidense. Por exemplo, no caso dos combustíveis parece haver total desprezo pela crise energética mundial que se apresenta. O consumo de milho para fins carburantes é da ordem de 30% do que é produzido o que significa quase 1,5 vez a produção brasileira do cereal.

            Dados de 2005 apontam que só a capacidade de armazenagem de grãos de capital privado nos EUA é da ordem de 120 milhões de toneladas. A capacidade total chega a quase 500 milhões de toneladas para uma produção de grãos estimada em 400 milhões de toneladas. Cerca de 65% está localizada na zona rural.

            Por sua vez, no Brasil a capacidade estática atual soma 123,3 milhões de toneladas, para uma produção de grãos prevista em abril de 2008 em 140,8 milhões de toneladas pela CONAB2. Apenas 15% localizam-se nas propriedades agrícolas, o que sobrecarrega o transporte e a armazenagem intermediária em época de colheita.

            As empresas brasileiras hoje são responsáveis por 74% da rede existente, condição que foi revertida paulatinamente, desde a política de privatização a partir de meados da década dos anos 1990, época em que predominava a armazenagem pública por conta da preocupação governamental de formação de estoques reguladores para evitar a explosão inflacionária.

            Devido ao alto custo do carregamento de estoques, o Governo "transferiu" a responsabilidade para o setor privado diminuindo assim sua interferência no mercado3.

            Segundo orientação da FAO o ideal é que a capacidade estática de um país seja 1,2 vez maior que a produção de grãos, o que de fato ocorre nas condições estadunidenses que é 1,25. No Brasil a relação é de apenas 0,87. Para atender a este requisito a capacidade estática de armazenagem nacional deveria ser de 169,0 milhões de toneladas.

            Aqui cabe uma observação que, em parte, ameniza o problema, pois nos países do Hemisfério Sul por conta de condições climáticas menos adversas há possibilidade de colheitas sucessivas de grãos com a possibilidade de rotatividade nos bens armazenados, sem que haja preocupação tão rigorosa quanto à formação de estoques, sobretudo pela estabilidade da economia.

            Para efeito de ilustração a safrinha de milho (2a safra) tem crescido aceleradamente e já responde por 30% do total de milho produzido no Brasil. E, no caso do feijão, a lavoura é conduzida três vezes por ano embora pouco representativa frente ao milho, soja e arroz responsáveis por 90% da safra de grãos.

            Nesse caso, pode ser aplicado o fator de rotatividade 1,5, de plena aceitação universal, para cálculo da capacidade dinâmica. Assim nas condições brasileiras chegar-se-ia a uma capacidade dinâmica de 184,9 milhões de toneladas, que seria suficiente para a guarda de toda a safra e com relativa folga ainda para a estocagem de produtos importados, trigo em especial e, ainda assim, permitir a formação de estoques reguladores.

            Esse fator tem aceitação/uso universal, pois dentro de uma nação as colheitas não são coincidentes; grande parte delas tem pronto consumo interno ou seguem rapidamente para o exterior, encurtando assim o canal de comercialização.

            Cabe ressaltar que nem sempre as condições e localização das unidades são as mais adequadas e racionais, o que provoca periodicamente transtornos circunscritos, tanto para a guarda como para a movimentação das mercadorias, fato que afeta sobremaneira a logística acarretando elevação nos custos. Nos últimos tempos têm sido disponibilizados recursos oficiais, para ampliação dessa infra-estrutura, sobretudo visando à ampliação e modernização de unidades de cooperativas e produtores agrícolas, mas nem sempre os interessados se dispõem a contrair empréstimos por conta dos elevados riscos da atividade agrícola. Mas de fato tem ocorrido ampliação do número de unidades por conta de produtores mais capitalizados, sobretudo da Região Centro-Oeste do País.

            Para evitar as pressões de logística que ocorrem em determinadas regiões nos períodos de colheita, o BNDES4 acaba de lançar o "Programa de incentivo à armazenagem para empresas cerealistas", complementar às linhas já existentes no atual Moderinfra.

            A nova linha de financiamento disponibilizará R$300 milhões até o final do ano, com condições especiais para contratação dos recursos.

            Dentro desse contexto, recente trabalho divulgado pelo IEA5 sugere a implantação de centrais regionais de armazenagem como forma de ampliar a capacidade e modernizar a comercialização de grãos no Estado de São Paulo a exemplo dos grain elevators existentes nos Estados Unidos.

            Em razão do continuado aumento da produção de grãos para atendimento da demanda interna e do comércio exterior, são necessários investimentos sistemáticos na busca da eficiência em infra-estrutura - armazenagem, malha viária e portos para que o Brasil se torne de fato competitivo no cenário mundial.

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1DONLEY, A. Grain storages and handling projects...a review. World Grain, p. 38-39, 1 jun. 2007. Disponível em: <http://am.sosland.com/ActiveMagazine/getBook.asp?Path=WG/2007/06/01&BookCollection=WG_AM&Reader Style =Gray >. Acesso em: abr. 2008.

2COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO - CONAB. Disponível em: <http://www.conab.gov.br>. Acesso em: abr. 2008

3CRUZ, A. C. da; TEIXEIRA, E. C. Desempenho da política de garantia de preços via contrato de opção de venda e prêmios para escoamento de produto. Revista de Política Agrícola, Brasília, v. 15, n. 4, p. 24 -36, out./dez. 2006.

4BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL - BNDES. BNDES cria programa de R$ 300 milhões para incentivar a construção de armazéns. Disponível em: <http://www.bndes.gov.br>. Acesso em: abr. 2008.

5NOGUEIRA JUNIOR, S.; NOGUEIRA, E. A. e. Centrais regionais de armazenagem como apoio à comercialização de grãos. Informações Econômicas, São Paulo, v. 37, n. 7, p. 27-33, jul. 2007. Disponível em: <http://www.iea. sp.gov.br>. Acesso em: abr. 2008.

Palavras-chave: infra-estrutura, armazenagem, grãos.

Data de Publicação: 05/05/2008

Autor(es): Sebastião Nogueira Junior (senior@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor