Avanço do Etanol nos Estados Unidos torna o Brasil Terceiro Maior Exportador Mundial de Milho

            Mudou o paradigma do milho no Brasil. De produto de mercado interno, sem vinculação com o mercado global, cultivado com sistemas de produção tradicionais, o milho transformou-se, nos últimos quinze anos, em produto de mercado externo, passando a integrar a pauta de exportações do agronegócio brasileiro. Graças à conjunção de alguns fatores favoráveis, o cereal nacional tem marcado presença constante na lista de mercadorias embarcadas rumo aos destinos mais diversificados. Em 2001, a taxa de câmbio, a safra recorde e os baixos preços internos, além da natureza do grão (não-transgênico), favoreceram as exportações brasileiras de milho em grão, que atingiram 5,6 milhões de toneladas1.
            Situações curiosas entre produção de etanol e de milho são verificadas no Brasil e nos Estados Unidos da América (EUA). No Brasil, o etanol é produzido a partir da cana-de-açúcar, cuja cultura apresenta uma expansão significativa, substituindo outras culturas menos rentáveis, entre elas a de milho. Nos EUA, o etanol é produzido quase que exclusivamente do milho, cuja cultura cresce vertiginosamente em detrimento de outros grãos, como a soja2.
            O aumento da área de milho nos próximos anos nos EUA objetiva o abastecimento das destilarias de álcool, o que deve resultar em menor disponibilidade de grão para outros destinos, como a exportação e a indústria de rações. Portanto, o avanço do etanol de milho nos Estados Unidos, de um lado, abre espaço para o Brasil, Argentina e outros países concorrentes, no mercado de exportação de milho em grão e de seus derivados, mas, de outro, estimula a produção de soja em países, como o próprio Brasil e a Argentina.
            Desde o início do boom do etanol de milho nos EUA, os preços do cereal subiram acentuadamente, passando dos tradicionais 2 dólares para 4 dólares o bushel, o que causou e vem causando impactos muito expressivos nos mercados globais do milho, da soja, do trigo e das rações e, por 'efeito dominó', nos mercados de carnes, dado o encarecimento dos seus custos de produção.
            A produção de milho nos EUA, que caiu sucessivamente nos últimos três anos, deverá crescer significativamente nos próximos anos, movida pela expansão do mercado de etanol elaborado com o cereal (Tabela 1). O levantamento de intenção de plantio dos agricultores dos EUA na safra 2007/08, divulgado em 30 de março de 2007 pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA)3, indicou crescimento de 15% da área total de milho, em relação à safra 2006/07 e de 11% em relação à 2005/06. Se confirmada essa previsão, será a maior área plantada desde 1944, quando atingiu 95,5 milhões de acres (38,6 milhões de ha).

Tabela 1 - Produção de Milho, Principais Países, 2001 a 2007

(em milhão de t)

País
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Part. %
Estados Unidos
251,9 
241,4 
227,8 
256,3 
299,9 
282,3 
267,6 
38,5
China
106,0 
114,1 
121,3 
115,8 
130,3 
139,4 
143,0 
20,6
Argentina
15,4 
14,7 
15,5 
15,0 
20,5 
15,8 
22,0 
3,2
Brasil
41,5 
35,5 
44,5 
42,0 
35,0 
41,7 
49,5 
7,1
Subtotal
414,8 
405,7 
409,1 
429,1 
485,7 
479,2 
482,1 
69,3
Outros
175,2 
193,4 
193,9 
196,6 
226,5 
216,2 
213,7 
30,7
Total mundial
590,0 
599,0 
603,0 
625,7 
712,2 
695,4 
695,8 
100,0

Fonte: USDA.

            O explosivo crescimento da economia chinesa tem provocado desequilíbrios entre a produção e o consumo interno de milho, de forma que menos cereal tem sido destinado à exportação. De acordo com o USDA, em 2006 (ano-safra 2005/06), o Brasil superou a China na quantidade de milho exportado. Mantida a tendência de crescimento acelerado do consumo da China e dos EUA, o Brasil pode se consolidar como o terceiro país maior exportador de milho, atrás somente da Argentina e dos EUA (Tabelas 2 e 3).

Tabela 2 - Consumo de Milho, Principais Países, 2001 a 2007

(em milhão de t)

País
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Part. %
Estados Unidos
198,1 
200,9 
200,7 
211,6 
224,6 
231,7 
238,4 
32,7
China
120,2 
123,1 
125,9 
128,4 
131,0 
137,0 
141,0 
19,4
Argentina
5,6 
4,2 
4,1 
4,4 
5,2 
6,2 
7,0 
1,0
Brasil
34,5 
35,0 
35,8 
36,3 
38,5 
39,5 
41,0 
5,6
Subtotal
358,4 
363,2 
366,5 
380,7 
399,3 
414,4 
427,4 
58,7
Outros
251,3 
259,4 
260,9 
267,0 
285,7 
287,2 
300,9 
41,3
Total mundial
609,8 
622,7 
627,4 
647,7 
685,1 
701,6 
728,2 
100,0

Fonte: USDA.


Tabela 3 - Exportação de Milho, Principais Países, 2001 a 2007

(em milhão de t)

País
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Part. %
Estados Unidos
48,3 
47,3 
40,9 
48,8 
45,3 
56,2 
57,2 
65,1
China
7,3 
8,6 
15,2 
7,6 
7,6 
3,7 
3,5 
4,0
Argentina
12,2 
8,6 
12,3 
10,4 
14,6 
10,0 
14,5 
16,5
Brasil
3,7 
3,9 
3,2 
5,8 
1,4 
4,5 
6,5 
7,4
Subtotal
71,6 
68,3 
71,7 
72,6 
68,9 
74,4 
81,7 
93,0
Outros
4,8 
6,2 
6,8 
6,6 
7,6 
8,6 
6,2 
7,0
Total mundial
76,4 
74,5 
78,5 
79,2 
76,6 
83,1 
87,8 
100,0

Fonte: USDA.

            As exportações brasileiras de milho em grão na atual década passaram a ter significância no mercado apenas a partir de 2001, quando se exportou o volume recorde de 5,6 milhões de toneladas e para um número expressivo de países4. Desde então, os embarques do cereal para o exterior têm sido oscilantes, dependendo da disponibilidade e dos preços do produto no mercado interno e da taxa de câmbio (Tabela 4).
            Entre os países que importaram milho do Brasil no período 2001 a 2006 destacam-se, pela regularidade e pela magnitude dos embarques, os três maiores da lista (Irã, Coréia do Sul e Espanha) e Portugal. Diferentemente da Argentina, que detém largo trade share no mercado global de milho há muito tempo, o Brasil ainda não consolidou parceria comercial com importantes países importadores do cereal.

Tabela 4 - Exportações Brasileiras de Milho em Grão, Principais Países de Destino, 2001 a 2006

(em 1.000 t)

País
2001
2002
2003
2004
2005
2006
Total 
Part. % 
Irã
658
342
435
1.305
700
1.770
5.210
23,8
Coréia do Sul
1.238
750
737
1.450
164
799
5.138
23,4
Espanha
884
292
920
461
66
774
3.397
15,5
Japão
583
382
245
17
24
0
1.252
5,7
Coréia do Norte
554
52
8
138
0
111
862
3,9
Portugal
115
31
120
166
33
91
555
2,5
Holanda
19
0
58
265
0
91
433
2,0
Itália
6
0
81
332
0
9
428
2,0
Polônia
130
0
0
272
0
0
402
1,8
Israel
165
0
160
0
0
76
401
1,8
Marrocos
42
150
146
31
0
0
369
1,7
Chile
89
105
40
13
0
10
256
1,2
Subtotal
4.481
2.104
2.949
4.450
987
3.731
18.702
85,3
Outros
1.143
635
612
568
70
193
3.222
14,7
Total
5.624
2.739
3.561
5.019
1.057
3.924
21.924
100,0

Fonte: Elaborada a partir de dados originais da SECEX.

            Enquanto as exportações do milho em grão têm se expandido a partir de 2001, outros derivados do cereal vêm sendo embarcados para o exterior há mais tempo. Assim, considerando-se os últimos dez anos, constata-se que as exportações de semente de milho em 1997 representaram mais que o dobro dos embarques de 2001, as de amido foram 11% superiores e ambas vêm crescendo sucessivamente em anos mais recentes. Destaque-se, também, nesse aspecto, as exportações de farinha de milho e de óleo bruto (Tabela 5).

Tabela 5 - Exportações Brasileiras de Milho e Derivados, Principais Produtos, 1997 a 2006
 

 

1Índice simples: 2001 = 100.

Fonte: Elaborada com dados originais da SECEX.
            Segundo as projeções da agricultura mundial até 2016, do USDA5, divulgadas em fevereiro de 2007, a crescente demanda mundial por combustíveis renováveis provocarão alterações significativas na produção, no consumo e nos preços de várias commodities, além do milho.
            Entre os impactos globais da 'febre do etanol' nos EUA, aliados ao forte crescimento da economia chinesa, citam-se as alterações do mercado de milho, com o Brasil passando a ocupar, a partir de 2007, a terceira posição no ranking dos países exportadores do cereal, trocando de posição com a China. Resta saber até que ponto as condições internas de infra-estrutura de transporte e a competição das culturas de soja e cana-de-açúcar, fortemente estimuladas pela demanda mundial de biocombustíveis, serão barreiras ao crescimento da produção de milho no Brasil.

______________________________________________________________

1Ver: TSUNECHIRO, A. (2003). Brasil: novo player no mercado internacional de milho. Disponível em: <http://www.iea.sp.gov.br/out/verTexto.php?codTexto=872>. Acesso em: 10 abr. 2007.
2Ver: BAKER, A.; ZAHNISER, S. Ethanol reshapes the corn market. Amber Waves, v. 4, n. 2. p. 30-35, Apr. 2006.
3DEPARTAMENTO DE AGRICULTURA DOS ESTADOS UNIDOS (USDA). Prospective plantings. Disponível em:<http://usda.mannlib.cornell.edu/usda/current/ProsPlan/ProsPlan-03-30-2007.pdf>. Acesso em: 30 mar. 2007.
4MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR. SECRETARIA DE COMÉRCIO EXTERIOR (SECEX). Disponível em: <http://aliceweb.desenvolvimento.gov.br/default.asp>. Acesso em: 15 mar. 2007.
5USDA agricultural projections to 2016. Office of the Chief Economist, World Agricultural Outlook Board, U.S. Department of Agriculture. Prepared by the Interagency Agricultural Projections Committee. Long-term Projections Report OCE-2007-1, 110 pp. Disponível em: <http://www.ers.usda.gov/publications/oce071/oce20071.pdf>. Acesso em: 12 mar. 2007.
Palavras-chave: milho, comércio exterior, etanol.

 

Data de Publicação: 03/05/2007

Autor(es): Alfredo Tsunechiro (tsunechiro@uol.com.br) Consulte outros textos deste autor
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