Café: movimento de alta mantém fundamentos

            As novas estimativas de produção e consumo mundiais de café indicam um déficit de oferta da ordem de até dez milhões de sacas para o ano-safra 2005/06, o que deve reduzir os estoques e continuar pressionando as cotações do café nos diferentes mercados.
            Em março, as cotações do café apresentaram fortes flutuações, mas continuaram em alta na Bolsa de Nova Iorque, com a cotação média do arábica (Contrato C, segunda posição) aumentando 11,96% em relação à média de fevereiro. No mercado de café robusta da Bolsa de Londres, o aumento foi ainda maior (16,46%) para a segunda posição. No mercado de futuros da BM&F, o preço do arábica subiu 9,31% também para a segunda posição. Ao considerar o indicador OIC-Composto diário, a alta foi de 13,47% em relação à média de fevereiro.
            No gráfico 1, é possível verificar o comportamento das cotações nos últimos 27 meses, com destaque para os últimos quatro meses da série.

Gráfico 1 - Cotações médias mensais do café em diferentes mercados de futuros (segunda posição) e do OIC-Composto diário, 2003 a 2005

Fonte: Gazeta Mercantil

            Também em março, a cotação exibida pela BM&F esteve um pouco menos pressionada do que a da Bolsa de Nova Iorque. A pequena desvalorização do real explica parcialmente esse resultado. De fato, a maior disponibilidade de café, reflexo da aproximação do início da colheita da safra 2004/05, motivou os produtores a aumentar o fluxo de comercialização do produto.
            As cotações dos arábicas, contrato C, segunda posição, na Bolsa de Nova Iorque, exibiram crescimento ao longo do mês, com média 11,96% maior do que a cotação média de fevereiro. Mas tiveram grandes oscilações, com a forte alta dos primeiros dez dias do mês não se sustentando em seguida (gráfico 2). Nesse período, o diferencial de preço entre o arábica cotado na BM&F e o Contrato C na Bolsa de Nova Iorque foi de US$ 17,24 por saca, cerca de 42,60% a mais do que o observado no mês de fevereiro de 2004.

Gráfico 2 - Cotações diárias em março de 2005 na Bolsa de Nova Iorque, para café arábica, Contrato C, segunda posição

Fonte: Gazeta Mercantil

            A evolução dos preços do café nos diferentes mercados, cotados em dólar por saca, indica variação na BM&F, para o arábica segunda posição, de 88,79% nos últimos doze meses. Jáem 2005 atingiu uma variação de 29,31%. No mercado de Nova Iorque, os preços do arábica, contrato C, segunda posição, cresceram 73,3% nos últimos doze meses e 28,3% em 2005. Já os preços do robusta no mercado de Londres, segunda posição, tiveram variação acumulada de 35,71%, nos últimos doze meses, e de 28,8% em 2005. A estimativa do OIC-Composto apresentou crescimento acumulado de 66,8% em doze meses e de 31,4% no ano de 2005, fortemente influenciada pelos preços do arábica.
            Essas confirmações do crescimento das cotações indicam que o produto se encontra em expressivo ciclo de alta. O gráfico 3 mostra que as cotações do café arábica se encontram em nível superior ao verificado em 2000, o último ano do último ciclo de alta do produto.

Gráfico 3 - Cotações médias anuais do café em diferentes mercados de futuros (segunda posição) e do OIC-Composto diário, 2000 a 2005
 

Fonte: IEA

            O cafeicultor paulista também foi favorecido pelas altas observadas no mercado internacional. O preço médio de março aumentou 11,76% em relação ao preço médio observado em fevereiro. A trajetória dos preços de café recebidos pelos produtores, em reais, nos últimos 12 meses, aponta para uma alta acumulada de 665% em doze meses e de 25,1% somente em 2005 (gráfico 4).

Gráfico 4 - Preços médios mensais recebidos pelos produtores de café arábica, Estado de São Paulo, 2002/05

Fonte: Instituto de Economia Agrícola

            Procurou-se, também, avaliar a evolução dos preços médios anuais recebidos pelos produtores de café no Estado de São Paulo, no período de 2000 a 2005. Este último ano se refere à média dos meses de janeiro e março, tanto em valores nominais quanto em valores reais, utilizando-se como deflator o Índice de Preços ao Consumidor Ampliado (IPCA) do IBGE1.
            Assim, verifica-se que as médias de 2005 se situaram, em valores reais, 15,2% acima das observadas em 2000. Isto indica que os cafeicultores paulistas estão recebendo mais pelo seu produto, pela primeira vez nos últimos 6 anos (gráfico 5).

Gráfico 5 - Preços médios anuais (nominais e real) recebidos pelos produtores de café arábica, Estado de São Paulo, 2000/05

Fonte: IEA

Nova resolução do CMN para financiamento do café

            Em 16/03/2005, o presidente do Banco Central do Brasil sancionou resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) aprovando linha de crédito de R$ 500 milhões do Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafe) para o financiamento de colheita e estocagem de café da safra 2004/05. Os beneficiários poderão contratar diretamente ou por intermédio das cooperativas R$ 1.400,00 por hectare, não podendo exceder a R$ 140.000,00 por produtor.
            O prazo para contratação vai até 31/10/2005, com liberação em parcela única ou, a critério do agente financeiro, em parcelas em consonância com a execução das etapas da colheita. A quitação ocorrerá após 90 dias contados da data de término da colheita prevista pela EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária)2.
            Para a estocagem, o CMN aprovou R$ 140 mil por produtor com teto de até R$ 3 milhões para cooperativas repassadoras dos recursos. A contratação teve início em 01/04/2005, estendendo-se até 01/01/2006. Nesse caso, a liberação do financiamento ocorre sempre em parcela única e o reembolso ocorrerá 180 dias após a contratação com algumas pequenas diferenças para as diversas zonas cafeeiras do País.
            A concessão do crédito seguirá o funcionamento do EGF (Empréstimos do Governo Federal), com garantia através de conhecimento de depósito, warrant ou recibo de depósito. Para fins de quitação, serão utilizados os preços mínimos vigentes para a safra 2004/05.
            A novidade dessa resolução foi a inclusão da indústria de torrefação e moagem de café, de cooperativas e de cafeicultores que processem o produto como beneficiários de linha especial de crédito (LEC) com recursos das exigibilidades bancárias. Para cafeicultores com indústria de torrefação, o limite do empréstimo também é de R$ 140 mil; para as cooperativas, de até 100% de sua capacidade de industrialização; e de 50% de sua capacidade para as demais agroindústrias (torrefadoras) com limite de R$ 10 milhões. O prazo de contratação estende-se até 31/03/2006.

Cafeicultores e seu falso dilema

            Há uma antiga reivindicação da indústria de transformação de café, especialmente do segmento de café solúvel, para a regulamentação de estratégias comerciais apoiadas nas importações de grão verde em regime de drawback. Formalmente, não existe impedimento para tal estratégia, mas a representação do segmento da produção consegue, amparada em barreiras sanitárias, impedir a entrada das importações no País.
            Do ponto de vista daqueles que barram as transações, o argumento é de que o Brasil produz leque suficientemente amplo para atender todos os tipos de blend. Ademais, o País transformou-se no segundo maior produtor da variedade robusta no mundo, carecendo de importações desse tipo.
            Falta às lideranças dos cafeicultores clareza quanto ao padrão atual das economias e empresas globais. Sem acesso facilitado às distintas fontes de matéria-prima, muitas companhias descartam o Brasil como pólo relevante para a abertura de filiais e/ou de novos aportes de investimento naquelas já instaladas.
            Também, por razões específicas do mercado doméstico (guerra de preços e aumento de conillon no blend), se observa um descolamento das cotações do robusta brasileiro daquela cotaçãoreferencial da Bolsa de Londres para o mercado internacional. Esse descolamento prejudica a competitividade da indústria brasileira de café solúvel que presencia a sua substituição por outros fornecedores mais competitivos. Esse é o tipo de jogo em que todos perdem, pois o café brasileiro deixa de ser consumido no exterior, os dólares não entram, os empregos não são gerados e os impostos não são recolhidos.

O ano do Brasil na França

            A Companhia Brasileira de Distribuição (controladora das marcas Pão de Açúcar, Compre Bem, Extra e Eletro) possui aliança com a rede francesa Cassino, por meio da qual pretende tornar disponível nas gôndolas gaulesas centenas de produtos brasileiros. Numa primeira experiência, dentre aqueles que mais tiveram aceitação, estavam pelo menos duas marcas brasileiras de café torrado e moído. O resultado foi tão promissor que ensejou a oportunidade para ajustes dos contratos com ampliação dos volumes contratados.
            Essa experiência mostra que há um imenso interesse nos produtos do Brasil. Falta, assim, aos empreendedores e ao setor público o concerto de ações no sentido de explorar essas oportunidades comerciais para nossos produtos, de maneira a capturar valor e outros benefícios econômicos para o agronegócio café.2
 

________________________________

1IBGE: http://www.ibge.gov.br

2 EMBRAPA: http://www.embrapa.br

3Artigo registrado na CCTC-IEA sob número HP-22/2005


  
 

Data de Publicação: 06/04/2005

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Nelson Batista Martin (nbmartin@uol.com.br) Consulte outros textos deste autor