Amendoim: Valor Da Produção No Estado De São Paulo, 1970-2002

            Até o início dos anos 70s, o Brasil foi importante produtor de amendoim, ocupando papel expressivo tanto no suprimento interno de óleo vegetal quanto na exportação de subprodutos. Porém, diversos fatores políticos, tecnológicos e mercadológicos levaram, indiretamente, à redução do cultivo nacional e a modificações no perfil do mercado.
            Simultaneamente à crise mundial do petróleo, que elevou os preços dos insumos, houve o embargo das exportações estadunidenses de soja para a Europa, elevando as cotações dos grãos e das oleaginosas devido às perspectivas de aquisições de farelos protéicos das, então, União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e Comunidade Econômica Européia.
            A forte demanda internacional por farelo protéico, associada à conjuntura econômica interna (de estímulo às exportações), à estrutura agrária vigente e aos baixos recursos concedidos pela política agrícola brasileira, estimulou a migração dos produtores de amendoim para culturas mais rentáveis.
            Em resposta à crise mundial do petróleo, o governo federal lançou dois planos: o Plano Nacional do Álcool e o Plano Nacional de Óleos. No entanto, o segundo foi inviabilizado. Assim, a efetivação do Proálcool, em 1975, e o concomitante avanço da sojicultura brasileira, inserida na dinâmica internacional de grãos, associados aos altos preços internacionais da laranja, foram os principais fatores da redução do cultivo de amendoim no Estado de São Paulo. No período 1969-80, cana-de-açúcar, soja, citrus, café e trigo incorporaram praticamente 91% das áreas plantadas com amendoim das águas e da seca. Entre 1981 e 1992, a incorporação por cana e citrus foi ainda maior, chegando próximo dos 99% das áreas cultivadas com o amendoim das águas e da seca.
            Segundo o Instituto de Economia Agrícola (IEA), na safra 1970/71, foram cultivados 505.780 hectares de amendoim, dos quais 203.280 hectares na da seca e 302.500 na das águas. Comparando estes dados com os da safra 1999/2000, verificam-se declínios de 89% e 82%, respectivamente, para as safras da seca e das águas.
            As áreas cultivadas com amendoim das águas e da seca atualmente representam, respectivamente, 11,25% e 17,75% do que foi cultivado na década de 70. Atualmente, são cultivados cerca de 80 mil hectares no Estado de São Paulo. Este patamar tem sido sustentado devido à redução dos custos de produção agrícola derivada das mudanças nas técnicas de cultivo do amendoim, o qual passou a ser plantado em rotação com a cana-de-açúcar.
            No âmbito do mercado, a expansão da sojicultura, a partir de meados da década de 70, deslocou as produções de algodão e de amendoim, culturas então responsáveis pela maior parte do fornecimento de matéria-prima para a produção de óleos comestíveis. As características físicas e a composição química da soja, diferente das outras oleaginosas, determinaram mudanças no nível do processamento, acompanhadas pela introdução de novos equipamentos que acabaram por alterar o perfil do mercado de amendoim. Na verdade, a soja, cujo principal subproduto é o farelo, expandiu-se para suprir a demanda internacional por proteínas visando à alimentação de animais confinados. No entanto, como do mesmo processo industrial obtêm-se tanto o óleo quanto o farelo, o primeiro ficou relegado ao mercado interno. A alta produção do óleo de soja teve reflexos nos baixos preços deste produto, sobretudo no mercado varejista, colocando-o em primeiro lugar em termos de consumo brasileiro e deslocando o principal mercado para o amendoim. A 'preferência nacional' pelo óleo de soja chegou ao ponto de suprimir o consumo doméstico do óleo de amendoim, obrigando o produtor de amendoim a buscar o mercado de doces e confeitos, o qual, para atender às exigências do consumidor, requer maior qualidade.
            Assim, a década de 90 registra declínio nas aquisições de grãos de amendoim por parte das esmagadoras (e a conseqüente queda na produção de subprodutos) em benefício do crescimento do consumo humano in natura, para suprir quase que unicamente o mercado de confeitos.
            As alterações na geografia e no mercado de amendoim foram concomitantes às melhorias tecnológicas: na década de 70, predominava o cultivo por pequenos e médios produtores e a colheita intensiva em mão-do-obra. Hoje os manicultores são médios e grandes arrendatários inseridos num sistema de capital intensivo e com potencial de aplicação do conjunto tecnológico já determinado pela pesquisa agronômica.
            No entanto, o comportamento do valor da produção de amendoim não evoluiu positivamente (gráfico 1).

Figura 1 – Valor da Produção de Amendoim, Estado de São Paulo, 1970/71-2001/02

                  Fonte: Elaborada a partir de dados básicos do IEA.

            O valor da produção primária de amendoim decaiu 3,14% ao ano no período 1970/71 a 2001/02. Isso é proporcionado pelas taxas médias de crescimento anual da inter-relação entre as variáveis preço médio recebido pelo produtor, produtividade e área total plantada com amendoim no Estado de São Paulo. As duas primeiras apresentaram taxas de crescimento anual negativas de 1,34% e 2,54% no período 1970/71 a 2001/02. Já a produtividade, mesmo apresentando comportamento diferenciado, ou seja, crescimento de 0,74% ao ano, não foi suficiente para compensar a redução de área.
            Nos últimos anos, tem-se estimulado a produção de amendoim do tipo runners (de padrão internacional), visando a um mercado alternativo para o amendoim em grão e a uma 'possível' melhora na renda do produtor. No entanto, o sucesso desse processo requer maior clareza, por parte do Ministério de Agricultura e Abastecimento, quanto às exigências sanitárias para exportação e inúmeras delongas burocráticas. Além disso, exige-se adequação dos sistemas de produção agrícola e industrial e provável alteração no mapa de produção do Estado de São Paulo. Assim, reabrir o mercado externo para o amendoim nacional é, sem dúvida, uma tarefa difícil e demorada... Não seria menos custoso estimular a demanda doméstica? Uma das sugestões seria diversificar o produto por meio de alterações de sabores e aromas do amendoim tostado (e/ou frito), a exemplo do que já ocorre na Europa e do que tem sido feito com a soja, aqui no Brasil.
 
 

1 WILKSON, John. Competitividade da agroindústria brasileira. Agricultura em São Paulo. São Paulo, IEA, 42(1):27-56. 1995.
2 CASER, D.V. ; ANEFALOS, L.C. ; CAMARGO, A.M.M.P. de; OLIVETTI, M.P. de A.; FAGUNDES, L. Evolução Regional das Principais Atividades Agrícolas do Estado de São Paulo, 1969 a 1992. Série Informações Estatísticas da Agricultura, SP, 2(5): 1-60, 1994.
3 ALVAREZ, Vitor M.P.; GUTIERREZ, Ramon H. e MACHADO, Magali C.M. Caracterização da dinâmica técnica do setor de óleos vegetais. s.n.t. 7p. (mimeo). Trabalho apresentado no seminário sobre Complexos agroindustriais de rações e óleos vegetais, São Paulo, 1986.  

Data de Publicação: 02/12/2002

Autor(es): Silene Maria de Freitas (silene.freitas@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Mario Antonio Margarido (mamargarido@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Afonso Negri Neto (afonsonegri@yahoo.com.br) Consulte outros textos deste autor