Mel brasileiro troca Europa por Estados Unidos

            A exportação brasileira de mel aumentou 39,6% em janeiro-outubro de 2006, para US$ 20,1 milhões, comparado a igual período do ano anterior, contrariando previsões decorrentes do embargo imposto pela União Européia ao produto brasileiro. O encolhimento das vendas para a União Européia foi compensando, em grande parte, pela exportação para os Estados Unidos, que cresceu 294,1% no mesmo período, para US$ 14,1 milhões.1
            A União Européia decidiu suspender a importação de mel produzido no Brasil sob a alegação de que o País não tem equivalência com o bloco no que se refere às diretivas para controle de resíduos e qualidade do produto. O Brasil não estaria cumprindo o prazo de implantação das análises a serem feitas no âmbito do Programa Nacional de Controle de Resíduos (PNCR). A decisão entrou em vigor em 17 de março de 2006. O embargo não se aplicaria às remessas do produto em trânsito antes da entrada em vigor da medida.
            Em 2005, o Brasil exportou 14,4 mil toneladas de mel para a União Européia, apesar das várias análises realizadas no produto por parte daquele bloco comercial, gerando uma receita de US$ 18,9 milhões. São Paulo (US$ 7,72 milhões), Ceará (US$ 3,4 milhões), Piauí (US$ 3,05 milhões) e Santa Catarina (US$ 2,93 milhões) foram os principais exportadores.2
            As vendas do primeiro trimestre de 2006 para a União Européia, portanto antes do embargo, tiveram incremento de 49,11%, para US$ 6,01 milhões, em relação ao mesmo período de 2005. Somente as vendas para a Alemanha, maior mercado consumidor do mel brasileiro dentro da Europa, somaram US$ 4,077 milhões no primeiro trimestre do ano, o que representa cerca de 50% das exportações brasileiras para aquele país em todo o ano de 2005 (US$ 8,1 milhões).
            Para o presidente da Associação Brasileira de Exportadores de Mel (Abemel), José Henrique Fernandes Faraldo, as exportações do primeiro trimestre ainda não refletiam o embargo, que entrou em vigor em meados de março. Além disso, a base de comparação não é boa. Segundo ele, a safra de 2005 foi muito ruim e, por isso, o volume exportado foi menor. Os números do setor mostram que, em 2004, as exportações alcançaram 21 mil toneladas. Já em 2005, totalizaram 14,4 mil toneladas.3
            Avalia-se no mercado a possibilidade de o mel brasileiro estar sendo reexportado para a Europa, via Estados Unidos. Isto justificaria o aumento das exportações para os Estados Unidos. Assim, o embargo por parte da União Européia não teria acontecido pelo fato de o mel brasileiro ter apresentado traços de antibióticos, herbicidas ou pesticidas, mas sim por problemas no cumprimento do cronograma de análises acertado entre europeus e brasileiros.4
            Os dados referentes ao período de janeiro a outubro de 2005 e 2006 mostram o claro redirecionamento da exportação de mel brasileiro do mercado europeu para o norte-americano. A quantidade total exportada variou de 11.430 toneladas (2005) a 12.861 toneladas (2006) e o valor evoluiu de US$ 14,4 milhões nos primeiros 10 meses de 2005 para US$ 20,1 milhões no mesmo período de 2006, graças ao aumento do preço médio de US$ 1,26/kg para US$ 1,57/kg (tabela 1).
 

Tabela 01 - Exportação brasileira de mel natural em janeiro a outubro de 2005 e 2006. Para os principais países de destino

País
01 a 10/2005
01 a 10/2006
Variação entre períodos
Participação
Quantidade
Valor 
Quantidade
Valor 
Quantidade
Valor 
% no valor
t
US$ 1000
t
US$ 1000
%
%
antes
após
Estados Unidos
2.819
3.579
9.047
14.105
221,0
294,1
24,8
70,1
Alemanha
4.654
5.708
2.586
4.077
-44,4
-28,6
39,6
20,3
Reino Unido
3.095
3.984
831
1.251
-73,1
-68,6
27,6
6,2
Canadá
20
37
134
215
569,4
477,8
0,3
1,1
Sub-total
10.588
13.308
12.597
19.648
19,0
47,6
92,3
97,6
Outros
841
1.117
264
482
-68,6
-56,8
7,7
2,4
Total
11.430
14.425
12.861
20.130
12,5
39,6
100,0
100,0
Fonte: Elaborada pelos autores com dados básicos da SECEX/MDIC

            O Reino Unido teve suas importações de mel brasileiro reduzidas de 3.095 toneladas no período de 2005 para apenas 831 toneladas, enquanto a Alemanha reduziu menos, de 4.654 toneladas para 2.586 toneladas. Em contrapartida, as vendas para o mercado norte-americano aumentaram de 2.819 toneladas para 9.047 toneladas, na comparação dos dois períodos estudados. O preço médio pago pelo mel brasileiro aumentou 24%. A resultante desses movimentos foi que o valor da exportação de mel brasileiro aumentou 12,5% na quantidade e 39,6% no valor entre os dez meses iniciais de 2005 e 2006, apesar do embargo estabelecido em março.
            Ao comparar as exportações brasileiras de mel no período de janeiro a março com abril a outubro de 2006, ficam mais claras as conseqüências do embargo. No primeiro trimestre de 2006, as compras norte-americanas representaram 26,9% da quantidade total e, após o embargo, chegaram a 97,9%. As exportações ficaram restritas à América do Norte (EUA e Canadá). Em contrapartida, as compras da Alemanha e do Reino Unido caíram de, respectivamente, 39,7% para zero e 27,2% para 0,5% (tabela 2).

Tabela 02 - Exportação brasileira de mel natural antes e após o embargo europeu para os principais países de destino

País
04 a 10/2005 
04 a 10/2006 
Variação entre períodos
Participação
Quantidade
Valor 
Quantidade
Valor 
Quantidade
Valor 
% no valor
t
US$ 1000
t
US$ 1000
%
%
antes
Após
Estados Unidos
2.299
2.800
8.874
13.826
286,0
393,8
26,9
97,9
Alemanha
3.481
4.130
0
0
-100,0
-100,0
39,7
0,0
Reino Unido
2.257
2.825
74
70
-96,7
-97,5
27,2
0,5
Canadá
20
37
134
215
569,4
477,8
0,4
1,5
Sub-total
8.058
9.793
9.082
14.112
12,7
44,1
94,2
99,9
Outros
491
601
1
7
-99,8
-98,8
5,8
0,1
Total
8.548
10.394
9.083
14.119
6,3
35,8
100,0
100,0
Fonte: Elaborada pelos autores com dados básicos da SECEX/MDIC

            De olho na recuperação do mercado perdido, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) começa a tomar providências no sentido de atender as exigências dos europeus. Circular no 22/2006/DIPOA/SDA, de 11 de junho, estabelece o cadastramento de todos os apicultores que fornecem mel para entrepostos com o objetivo de implantar a rastreabilidade no setor. Essa medida é questionável quanto à sua eficácia, uma vez que os entrepostos já são bastante rigorosos na análise do mel que adquirem dos produtores, segundo Constantino Zara Filho, presidente da Associação Paulista de Apicultores Criadores de Abelhas Melificas Européias (APACAME)5. Além disso, vai aumentar a burocracia, devido à enorme quantidade de formulários a serem preenchidos, dificultando ainda mais a vida do apicultor.
            Outra circular do DIPOA (no 008/2006, de 28 de julho) solicita aos postos de vigilância que recolham no mercado todos os rótulos de mel composto (mel com guaco, mel com alho, mel com limão, etc.) para serem submetidos a análise. A medida deve gerar incertezas para o empresário que deseja desenvolver novas linhas de produtos, especialmente para atender o consumo doméstico. Setenta por cento do mercado interno é abastecido com mel composto, pois os entrepostos têm dificuldades de vender mel fracionado in natura para o consumidor nacional, principalmente os méis escuros (acima de 60 milímetros na escala Pfund que regula a cor), mais baratos, que contêm mais sais minerais, são mais encorpados e têm sabor mais apurado.5

Mercado interno

            Embora não existam estatísticas confiáveis, a produção anual é estimada em 35 mil a 40 mil toneladas. Descontadas as exportações, a eventual falta de produto para abastecer o mercado doméstico é suprida com importações de mel mais barato da Argentina e do Uruguai. Dados do Ministério do Desenvolvimento mostram que em 2005 o Brasil importou 7.498 quilos, número que pode ser maior se for considerado o produto que entra pela fronteira sem registro.5
            Uma evidência de que não há excedente de mel é que os produtores não têm procurado sua entidade nos últimos anos, pelo menos em São Paulo, o maior mercado consumidor, para realizar feira de negócios para desova do produto. Em plena florada da laranja, o mel claro (de 30 a 40 milímetros) está com o preço aquecido. A lata de 25 kg é avaliada entre R$ 95 e R$ 100 para aquisição de grandes quantidades (acima de 100 latas), bem além dos R$ 60 praticados até junho último. No caso do mel silvestre claro, o preço está em torno de R$ 85 para grandes quantidades.5
            Ao câmbio atual, o mel importado de Argentina e Uruguai para atender o consumo doméstico não entra no País por menos de US$ 1.100 a tonelada. No mercado interno, o mel fracionado é vendido no mínimo a US$ 7 o quilo no varejo. Já a tonelada do mel brasileiro exportado é avaliada em US$ 1.500 a US$ 1.600, mas a China pratica preços entre US$ 900 e US$ 1.100. A possibilidade de um boom nas exportações e a conseqüente falta de mel para abastecimento interno, com impacto nos preços ao consumidor, está condicionada principalmente à melhora na taxa de câmbio.5

Os 50 municípios

            Os 50 maiores municípios produtores de mel do Brasil respondem por 29,65% (9,57 milhões de quilos) do volume total do Brasil (32,29 milhões de quilos), segundo dados de 2004 (último levantamento disponível) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE)6 (tabela 3).7

Tabela 3 - Municípios Brasileiros Maiores Produtores de Mel, 2004

Fonte: Produção Agrícola Municipal (IBGE, 2004)

_______________________
1 Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento (SECEX/MDIC). Disponível em: http://aliceweb.mdic.gov.br Acesso em 17/11/2006.
2 Mel: Câmbio e Embargo Europeu Podem Prejudicar Exportações em 2006. Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/out/verTexto.php?codTexto=5209; http://www.portaldoagronegocio.com.br/index.php?p=noticia&&idN=6708
3 Exportações brasileiras de mel crescem apesar do embargo europeu. Disponível em: http://www.empreendedor.com.br/?pid=28&cid=2019
4 Embargo europeu não impede aumento da exportação brasileira de mel. Agência Sebrae de Notícias. Disponível em: http://asn.interjornal.com.br/site/noticia.kmf?noticia=5377888&canal=199&total=1377&indice=30. Acessado em 06/10/2006
5 Entrevista de Constantino Zara Filho, presidente da APACAME, concedida em 01/11/2006
6 IBGE: www.ibge.gov.br
7 Artigo registrado no CCTC sob número HP-113/2006.

Data de Publicação: 28/11/2006

Autor(es): Eder Pinatti (pinatti@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
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