Café: novo instrumento de política para a cafeicultura, o EGF

            Em julho, o mercado de café esboçou ligeira recuperação nas cotações, uma vez que as instabilidades climáticas previstas acabaram não ocorrendo, o que elevou as cotações médias. No mercado de Nova Iorque, o café arábica (Contrato C, segunda posição) teve alta de 1,74% na posição de setembro. Na Bolsa de Londres, o preço do café robusta apresentou elevação de 2,24%. Na BM&F1, as cotações do arábica alcançaram 2,28%, enquanto no preço composto diário da OIC2 observou-se aumento de 3,94% (gráfico 1).

Gráfico 1 - Cotações médias mensais do café em diferentes mercados de futuros, 2001 a 2003

                              Fonte: Gazeta Mercantil

            Mesmo com tendência de alta em julho, o mercado internacional de café continuou fortemente influenciado pelas expectativas de geada no Brasil, apresentando elevada instabilidade. Essa flutuação nas cotações do café arábica na Bolsa de Nova Iorque (contrato C, segunda posição) pode ser observada no gráfico 2. Ela foi tão intensa que a partir de 18/07/03, quando caíram abruptamente, as cotações voltaram a recuperar posição apenas no final do mês.

Gráfico 2 - Cotações diárias no mês de julho na Bolsa de Nova Iorque, para café arábica, Contrato C, setembro de 2003

Fonte: Gazeta Mercantil

            Os altos estoques dos países importadores continuam sendo a variável principal da formação das cotações do café no mercado internacional. Isso faz com que não se tenha conseguido uma reversão na tendência baixista do mercado, mesmo sob menores colheitas em andamento nos países produtores, principalmente no Brasil, Colômbia e Vietnã.
            Em plena colheita, o cafeicultor brasileiro, com maior oferta do produto no mercado, teve ainda de enfrentar a valorização do real frente ao dólar. Essas duas ocorrências conduziram a um leve recuo o preço médio recebido pelos cafeicultores, mesmo considerando a pequena recuperação das cotações no mercado internacional ao término do mês (gráfico 3).
            Todavia, mesmo com a instabilidade das cotações de café em mercados de futuros nos últimos 12 meses, verifica-se alta acumulada menos expressiva de 42,77% e 21,20% nas cotações médias mensais do café arábica, respectivamente, na BM&F e na Bolsa de Nova Iorque e de 32,62% nas do robusta na Bolsa de Londres.

Gráfico 3.- Preços médios mensais recebidos pelos produtores de café no Estado de São Paulo, período de 2000 a 2003

                              Fonte: Instituto de Economia Agrícola

            De igual maneira, quando se avalia a trajetória dos preços de café recebidos pelos produtores, em reais, nos últimos 12 meses, verifica-se que cresceram 53,47%. Mas é importante destacar que, desde outubro de 2002, se têm mantido os mesmos patamares de preços, que sofreram forte recuo a partir de junho de 2003 (-12,58%). Isto tem trazido enorme insatisfação por parte dos produtores e das cooperativas, que pressionam o governo para implementar medidas de sustentação de preços do produto.

Chegou a hora de fazer contas

            A maciça compra de contratos de opção por parte dos cafeicultores de arábica mostra que tal medida foi bem recebida, muito embora o preço de exercício definido pela administração federal tenha sido enfaticamente criticado pelas lideranças do segmento. De outro lado, os cafeicultores de robusta não tiveram a mesma percepção das vantagens dessa política, tendo sido poucos os que adquiriram contratos.
            As análises vigentes apontam para estabilidade nas cotações nos próximos meses, sendo bastante provável que as opções sejam exercidas pelos cafeicultores. Desse modo, a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB)3 deverá preparar-se para receber, em seus armazéns, os cafés contratados para o exercício em setembro.
            Aqueles cafeicultores, possuidores de contratos de opções, devem começar a fazer contas para quantificar o custo dessa transação. Os itens de despesa envolvidos são diversos, mas todos agregam pequenos gastos que ao final podem inclusive conduzir ao não-exercício da opção de venda. Num esforço apenas aproximativo, procurou-se listar o rol de gastos adicionais para efeito de exercício da opção (tabela 1).

Tabela 1 – Estimativa de custo de transação para exercício dos contratos de opção de café

Item 
Tipo
Valor
Mínimo
Máximo
Pagamento do prêmio
Variável
350,00
500,00
Registro CEFIP
0,65/sc
65,00
65,00
Comissão do corretor
2% a 3 % por contrato
300,00
450,00
Sacaria nova
aporte da diferença sc usada1
100,00
100,00
Frete por 100/sc
400 a 700 km de deslocamento
360,00
430,00
Armazenagem 
0,50/sc
50,00
50,00
Total de despesas
-
1.225,00
1.595,00
Valor por saca
-
12,25
15,95
Valor do contrato
Exercício setembro/2003
190,00/sc
Preço praticado
Média quarta semana de junho
163,00/sc
Preço mais custos  
175,25
178,95
Vantagem apropriada
R$/contrato
1.475,00
1.105,00
R$/sc
14,75
11,05
1 Despesa reembolsável pela CONAB
Fonte: estimativas dos autores

            Ao se computar o conjunto das despesas incorridas pelos cafeicultores aderentes aos contratos de opção, alcançam-se gastos de R$ 1.225,00 a R$ 1.595,00 por contrato, ou seja, de R$ 12,25 a R$ 15,95 por saca de 60kg de café beneficiado. Considerando o preço de exercício estabelecido para setembro de R$ 190,00/sc, a vantagem apropriada pelo cafeicultor alcançaria entre R$ 11,05 e R$ 14,75 por saca. A dimensão de tais valores não é altamente significativa frente a uma atividade em que o desembolso de custeio é elevado. Entretanto, para o lote negociado (100 sc = um contrato), o valor passa a ser relevante, sobretudo para aqueles cafeicultores possuidores de vários contratos (limite de 10 por cafeicultor).
            As recentes desvalorizações do real têm imprimido elevação das cotações em reais do café. Caso esse tendência permaneça, a decisão quanto ao exercício ou não das opções torna-se complexa. Os possuidores de contratos podem considerar o não-exercício, assim que os preços para os cafés duros ultrapassarem a cotação de R$ 178,00/sc FOB armazém de entrega do produto.
            Observadas essas condições, avalia-se como muito bem ajustada a política dos contratos de opções para o café arábica, em que pese seu relativo fracasso quanto à venda de opções para café robusta. Tanto os cafeicultores poderão obter vantagens satisfatórias, caso não haja reação nos preços recebidos até data limite de realização da opção, quanto a sociedade brasileira poderá dar amparo a uma política que promova um produto com amplos desdobramentos econômicos e sociais.

EGF - Nova alternativa de comercialização

            A política cafeeira ganha novo instrumento para a regulação do fluxo da comercialização. O Banco Central do Brasil4, por meio da resolução 3.102, dispôs sobre o Empréstimo do Governo Federal (EGF-Sov) sem opção de venda para cafés da safra 2002/2003 com vencimento em dezembro do corrente ano. O montante destinado para o EGF-Sov foi de R$ 400 milhões e cada produtor pode emprestar no limite de R$ 60 mil, permitindo-se ainda que cooperativas e torrefadoras contratem empréstimos.
            Essa iniciativa pode traduzir-se em mais uma política dentro do esforço de ordenamento do fluxo de comercialização da safra de café. Tal demanda decorre da constatação de que muitos produtores terminam a colheita sob exaustão do caixa, necessitando comercializar urgentemente parte ou até mesmo a integralidade de sua safra.
            A taxa de juros aplicada aos empréstimos é a mesma do crédito rural oficial (8,75%). Os juros somariam 2,84%, tomando como base o mês de agosto para as contratações e dezembro para o vencimento. Para empréstimos lastreados em café de bebida dura, esse juro somaria um custo de aproximadamente R$ 5,00/sc no período e de R$ 2,50/sc do tipo robusta, considerando apenas os casos limites para a adesão à política. Não se leva em conta os demais custos como armazenagem, pois o produtor tem de ter seu café em armazém de terceiros e dentro das normas previstas de tipo, classificação, sacaria, etc., arcando com custos adicionais.
            Mais uma vez, a administração federal mostra sua crescente sensibilidade com a crise de preços que assola o segmento, oferecendo alternativas com chance de grande eficácia. Historicamente, as cotações para café costumam ser melhores no segundo semestre, sendo por vezes vantajosa a estratégia de iniciar a comercialização no quarto trimestre do ano e no começo do ano seguinte. Por isso, pode valer a pena realizar esse empréstimo ao menos para uma parcela do produto disponível à comercialização.

1Bolsa de Mercadorias & Futuros www.bmf.com.br
2 Organização Internacional do Café www.ico.org
3 CONAB: www.conab.gov.br
4 Banco Central do Brasil: www.bcb.gov.br

Data de Publicação: 05/08/2003

Autor(es): Nelson Batista Martin (nbmartin@uol.com.br) Consulte outros textos deste autor
Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Consulte outros textos deste autor