Embarques Brasileiros Sustentam Cotações Futuras do Café


 

O recrudescimento da pandemia no Brasil, atingindo patamares inimagináveis de contaminados e mortos, adicionou mais incertezas quanto a uma possível retomada da economia do país. Essa dúvida se reflete no mercado de cambial em que os investidores buscam refúgio para preservação de seu patrimônio por meio da aquisição de dólares, pressionando suas cotações. Ademais, essas mesmas incertezas represam investimentos estrangeiros, diminuindo a oferta de moeda que não foi compensada pela evolução das exportações que exibiram resultado cambial no bimestre abaixo de anos anteriores - apenas US$0,17 bilhão de saldo cambial no primeiro bimestre de 20212 (Figura 1).

 

Embora o primeiro bimestre tenha exibido pífio resultado para a balança comercial brasileira, há estimativas de que, em 2021, poderá ser obtido recorde histórico nessa conta, podendo alcançar US$90 bilhões, capitaneado por um provável excelente desempenho das commodities minerais e agrícolas. Esse desempenho, associado tanto à aceleração das privatizações programadas para o ano como à elevação da taxa SELIC, tem potencial de reverter a tendência de alavancagem do dólar, estabilizando mais suas cotações em médio prazo.

Na bolsa de Nova York, em que são negociados os contratos de cafés arábicas, foram observadas seguidas baixas nas cotações a partir da média da primeira semana do mês. Enquanto os contratos para julho/2021 exibiam média semanal de preços para a primeira semana do mês de US$¢134,64/lbp, a média da última semana teve recuo para US$¢125,24/lbp, ou seja, declínio de 6,98% no período (Figura 2).

 

Essa tendência baixista para o mês de março reflete aparentemente o incremento dos embarques brasileiros em plena entressafra do produto, uma vez que o relatório da Green Coffee Association aponta queda de 52,6 mil sacas dos estoques certificados em fevereiro de 20213. Segundo relatório do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (CECAFE)4, houve incremento de 6% nos embarques no primeiro bimestre de 2021 ante igual período do ano anterior, totalizando 6,9 milhões de sacas. O fluxo de suprimento brasileiro, associado à retomada parcial do consumo nos países importadores, ofereceu relativa tranquilidade aos traders, diminuindo a procura por contratos do produto no mercado futuro.

Em março de 2021, o preço médio recebido pelos cafeicultores do cinturão francano, contabilizados pelo Instituto de Economia Agrícola (IEA), foi de R$735,45/sc.5, representando pelo dólar médio do mês US$130,17/sc. (US$1,00=R$5,65). Efetuadas as devidas conversões, obtém-se cotação média para o mês de US$¢172,17/lbp. Aplicando-se deságio de 20% relativo ao diferencial frente ao contrato C para o café natural brasileiro acrescido das taxas mais emolumentos, o valor apurado alcança US$¢137,74/lbp. Cotejando esse valor com o negociado em segunda posição na Bolsa de Nova York para a última semana do mês US$¢131,34/lbp, o resultado é de US$¢6,40/lbp, ou seja, R$47,82/sc. Tal montante pode suscitar o interesse de cafeicultores em firmar posição no mercado futuro, hedgeando o preço de seu produto.

Na Bolsa de Londres, em que são negociados os contratos futuros do robusta, constaram, em março de 2021, oscilações das cotações médias semanais similares às verificadas para os contratos de arábica em Nova York (declínio persistente nas média das cotações semanais). Os embarques brasileiros de café conilon totalizaram 554 mil sacas no primeiro bimestre de 2021, representando incremento de 25% diante de igual período do ano anterior6, neutralizando, parcialmente, a queda de 17,6% das exportações vietnamitas observada em janeiro de 20217. Mais uma vez o fluxo de suprimento brasileiro trouxe tranquilidade para o mercado que não buscou no mercado futuro de café ativo, passível de especulação proveitosa (Figura 3).

Apesar da queda da quantidade de contratos em posição líquida transacionados na Bolsa de Nova York entre fundos e grandes investidores, ainda se mantém montante comprados acima de vendidos, sinalizando interesse pelo ativo (Tabela 1). Há entre os investidores desse mercado crescente receio de que os embarques brasileiros desabem por absoluta escassez do produto. Tal sentimento deverá nortear as decisões de investimento nos próximos meses, alavancando as cotações.

 

 

A partir de previsões de acentuada retomada econômica tanto para os EUA como para a China, contribuíram para alavancar as cotações internacionais das principais commodities agrícolas, especialmente, grãos, algodão e açúcar. O incremento de preços para o café bem mais modesto, comparativamente às demais, pode conduzir a substituição dessa lavoura por outras que se mostram mais rentáveis8. O cenário futuro da cafeicultura brasileira é bastante incerto com possibilidades remotas de que ocorra expansão da área cultivada. Sem a contribuição brasileira para o atendimento da crescente demanda, corre-se o risco de um contexto de severa escassez do produto associado a forte indução do cultivo entre nossos principais concorrentes, algo que fragiliza a posição do país como principal plataforma global para negócios em café.


1O autor agradece o trabalho de sistematização do banco de dados econômicos conduzido pelo Agente de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica do IEA Paulo Sérgio Caldeira Franco. 

 

2Ver análise completa das exportações do primeiro bimestre em: ANGELO, J. A.; GHOBRIL, C. N.; OLIVEIRA, M. D. M. Balança Comercial dos Agronegócios Paulista e Brasileiro, Primeiro Bimestre de 2021. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 16, n. 3, mar. 2021, p. 1-13. Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/
ftpiea/AIA/AIA-10-2021.pdf. Acesso em: 07 abr. 2021.

 

3GREEN COFFEE ASSOCIATION. Warehouse coffee stocks. New York: GCA, March 2021. Disponível em: http://greencoffeeassociation.org/wp-content/uploads/2021/03/2-2021-Warehouse-Stocks.pdf. Acesso em: 07 abr. 2021.

 

4CONSELHO DOS EXPORTADORES DE CAFÉ DO BRASIL – CECAFÉ. Relatório Mensal de Exportações. São Paulo: CECAFÉ, 2021. Disponível em: https://www.cecafe.com.br/publicacoes/relatorio-de-exportacoes. Acesso em: 07 abr. 2021.

 

5INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA. Preços médios diários recebidos pelos produtores. São Paulo: IEA, 2020. Disponível em: http://ciagri.iea.sp.gov.br/precosdiarios/precosdiariosrecebidos.aspx?cod_sis=6. Acesso em: 07 abr. 2021.

 

6Op. cit. nota 4.

 

7EXPORTAÇÕES de café do Vietnã em janeiro caíram 17,6%. Notícias Agrícolas, Campinas, 29 jan. 2021.Disponívelem: https://www.noticiasagricolas.com.br/noticias/cafe/278978-exportacoes-de-cafe-do-vietna-em-janeiro-cairam-176.html#.YHXgoehKiM8. Acesso em: 7 abr. 2021.

 

8VEGRO, C. L. R. Uma Imensa Centro América chamada Cafés do Brasil. CaféPoint, São Paulo, 7 abr. 2021. Disponível em: https://www.cafepoint.com.br/colunas/cenas-e-fatos-do-agro/uma-imensa-centroamerica-chamada-cafes-do-brasil-224883/. Acesso em: 7 abr. 2021.

  

Palavras-chave: mercado futuro, cotações do café, Bolsa de Valores.

 

 

 


 

 

 

COMO CITAR ESTE ARTIGO

VEGRO, C. L. R. Embarques Brasileiros Sustentam Cotações Futuras do Café. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 16, n. 4, abr. 2021, p. 1-5. Disponível em: colocar o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.

Data de Publicação: 14/04/2021

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor