Álcool brasileiro: exportações versus mercado interno

            Em 2001, o Brasil exportava cerca de 343 milhões de litros de álcool1, volume que saltou para 2,43 bilhões de litros em 2004. Em 2006, o envio de álcool para o exterior atingiu a marca de 3,42 bilhões de litros, surpreendendo alguns analistas do mercado de biocombustíveis que previam exportação em torno de 2,8 bilhões de litros.
            No período compreendido entre 2001 e 2006, as exportações de álcool cresceram 899,4% e, na comparação de 2006 com o ano anterior, as vendas externas aumentaram 32,3%. Essa aceleração ficou mais evidente a partir de 2004 com a introdução por alguns países da obrigatoriedade do uso do álcool como aditivo à gasolina, especialmente os Estados Unidos da América (EUA), principais importadores do álcool brasileiro.

 
Fonte: Elaborada pelos autores com dados da Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento (SECEX/MDIC)

            Há toda uma preocupação na busca de alternativas para diminuir o uso do petróleo como matéria-prima para a produção de combustíveis. Pode se verificar claramente no gráfico 1 a tendência acima citada.
            As exportações de álcool brasileiro, na sua grande maioria, serviam para uso industrial, muito pouco para uso carburante. Mas, a partir de 2003, iniciou-se uma tendência de aumento da parcela de exportação de álcool combustível, o que se concretizou nos anos seguintes. O álcool carburante tornou-se destaque a partir de 2004 e com grande perspectiva de se manter para o futuro.
            Para 2007, a expectativa é de que sejam produzidos cerca de 20 bilhões de litros de álcool no Brasil. Espera-se que, deste total, sejam exportados por volta de 4,5 bilhões de litros, ou seja, um aumento de 32,3% em relação ao ano anterior.
            São Paulo continua sendo o principal Estado de origem deste álcool com 75,4% dos embarques. O porto de Santos é responsável por 65,69% do total, seguido dos portos de Paraná e Alagoas.
            Com relação a 2006, em termos de valores, também houve crescimento nominal de 109,6%, ou seja, de US$ 765,50 milhões para US$ 1,6 bilhão. O preço médio da tonelada de álcool exportado ficou 58,48% maior em 2006, comparado ao ano anterior, ou seja, passou de US$ 295,3 para US$ 468,012.

Perspectivas

            Países como EUA, Venezuela, Trinidad Tobago, Holanda e El Salvador registraram significativos aumentos nas importações de álcool brasileiro em relação a 2005. Nestes países, é verificada uma demanda crescente, advinda de uma política de adição de álcool à gasolina, com exceção de El Salvador e Trinidad Tobago que mantêm bases de reexportação de álcool para os EUA.
            A sobretaxa imposta ao álcool exportado pelo Brasil aos EUA é de US$ 0,54 por galão (um galão tem 3,785 litros), ou de cerca de US$ 150,00 por metro cúbico. Esta taxa foi renovada até janeiro de 2009, mas com a hipótese de ser revogada, beneficiando ainda mais o Brasil.
            Caso isso ocorra, o álcool brasileiro tornar-se-á ainda mais competitivo no mercado norte-americano. Em conseqüência, haverá um crescimento nas exportações do Brasil para os EUA, já que os norte-americanos ainda não têm produção suficiente para atender toda a demanda interna pelo combustível renovável.
            Apesar da sobretaxa aplicada ao álcool brasileiro, as exportações para os EUA cresceram 577,7%, saltando de 260,7 milhões para 1,767 bilhões de litros de álcool, com uma participação do total exportado de 55%. Parte desse volume foi via direta e parte via Caribe, através do acordo CBI (Caribbean Basin Initiative) que permite que até 7% da demanda de álcool por parte dos norte-americanos possam entrar no país sem a sobretaxa de US$0,54 por galão cobrada aos países que estão fora do acordo.
            Porém, o crescente aumento dos preços da tonelada de álcool mais que compensou a sobretaxa de US$ 0,54, aplicada à importação de álcool brasileiro.
            Em 2007, possivelmente, haverá algumas boas perspectivas de ampliação do envio de etanol para os EUA, com a possibilidade de aumento da demanda pelo combustível por parte daquele país, advindo da substituição da gasolina no mercado americano, previsto em 20% até 2017. Por outro lado, essa possibilidade de demanda ainda maior nos EUA poderá incentivar os produtores de álcool no Brasil a direcionar sua produção para o exterior, em detrimento ao mercado interno, causando forte pressão altista nos preços praticados tanto internamente quanto para exportação.

Mercado interno

            Com a entrada em operação de mais 16 novas usinas no Centro-Sul do Brasil na safra 2007/08, a oferta do combustível limpo aumentará, garantindo, possivelmente, o abastecimento interno. O atendimento ao mercado doméstico precisa ser a prioridade das usinas, direcionando o excedente ao crescente mercado externo.
            A previsão é que o consumo interno em 2007 fique em torno de 15,4 bilhões de litros. Deve se observar que o consumo interno aumentou em média cerca de 700 milhões de litros de álcool hidratado a cada ano, no período de 2003 a 2006, início da introdução do carro bicombustível3.
            A perspectiva para os próximos anos é de que , a cada ano, esse acréscimo no consumo seja de cerca de 1,1 bilhão de litros, devido ao aumento das vendas e à produção de carros bicombustíveis, que chega a 82,7% da produção de automóveis leves4. Além disso, um direcionamento maior para a produção de álcool hidratado por parte das usinas em detrimento ao álcool anidro que é misturado a gasolina A, formando a gasolina C.
            Mas é necessário que o abastecimento interno não fique somente nas mãos do mercado, cabendo ao governo a adoção de mecanismos garantidores através de normas regulamentadoras. Entre elas, podem ser citadas: quantidade mínima de estoque necessário ao abastecimento interno durante a entressafra, financiado pelo setor privado e/ou por fundos internacionais; revisão das normas de distribuição do álcool; e medidas inibidoras à exportação, como garantia de disponibilidade do produto ao consumidor doméstico.
            Vale ressaltar que o Brasil não deve pagar o ônus de ter que limitar o mercado interno de álcool. As conseqüências seriam perder os benefícios ambientais e/ou pagar mais caro internamente pelo combustível, devido à possibilidade de sua escassez, caso seja direcionado para as exportações, e assim tirar o poder de escolha do consumidor para usar um combustível renovável.5

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1 Inclui álcool carburante e para a indústria
2 Para maiores detalhes sobre exportação de álcool brasileiro, países de destinos e portos e Estados de origem, consultar: TORQUATO, Sérgio A. & PEREZ, Luis H. Evolução das Exportações brasileiras de Álcool, período de 1996 a julho de 2005. Revista Informações Econômicas, SP, vol.36, n.3 mar. 2006 Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/out/verTexto.php?codTexto=5006 e: TORQUATO, Sérgio A. & PEREZ, Luis H. Exportações de álcool: Perspectiva de crescimento em 2006? Análises e Indicadores do Agronegócio. Vol.1 n.5, maio/2006 Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/out/verTexto.php?codTexto=5526
3 Informação a partir de dados das vendas pelas distribuidoras de combustíveis de 2005 - 2006 da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Disponível em: http://www.anp.gov.br/doc/dados_estatisticos/Vendas_de_Combustiveis_m3.xls
4 Informação a partir de dados fornecidos pela Associação dos Fabricantes de Veículos Automotores (ANFAVEA), www.anfavea.org.br.
5 Artigo registrado no CCTC-IEA sob número HP-16/2007.

Data de Publicação: 16/03/2007

Autor(es): Sérgio Alves Torquato (storquato@apta.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
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