A cultura da goiaba em São Paulo

            O Brasil, em 2004, foi o terceiro produtor mundial de frutas, com 38 milhões de toneladas, atrás apenas de China e Índia. No mesmo ano, as exportações brasileiras de frutas frescas movimentaram cerca de US$ 370 milhões, com aumento de 10% em relação ao ano anterior. Os principais destinos do produto brasileiro são os países europeus, as Américas do Norte e do Sul e o Oriente Médio, além de perspectivas de vendas para o mercado asiático .
            Dentre as frutas tropicais brasileiras, a goiaba ocupa lugar de destaque, não só pelo seu aroma e sabor como também pelo seu valor nutricional, o que coloca o Brasil na posição de maior produtor de goiabas vermelhas e a Índia em primeiro lugar na produção de goiabas brancas. Quanto à exportação brasileira, a goiaba ocupou, em 2004, o 26o lugar no ranking em volume comercializado, atingindo o patamar de US$ 117 mil.
            A goiaba pode ser consumida in natura e, principalmente, industrializada na forma de goiabada, geléias, pastas, fruta em calda, purê, alimentos para criança, base para bebidas, refrescos, sucos e xaropes. Atualmente, um novo produto, o guatchup, é desenvolvido pela empresa CNJ Internacional com a colaboração da Associação Brasileira dos Produtores de Goiaba (GOIABRAS), que apresenta alto valor nutricional, rico em licopeno, betacaroteno, vitamina C, ferro, cálcio e fibras e é menos calórico em relação ao seu concorrente feito de tomate.
            O consumo da fruta in natura ainda é pequeno, estimado em 300g/per capita/ano, embora a goiabada seja um dos doces mais apreciados pelos brasileiros.
            No território nacional, goiabais comerciais concentram-se, principalmente, nas regiões Sudeste e Nordeste, sendo os Estados de São Paulo e Pernambuco os maiores produtores (figura 1).

Figura 1 – Participação da produção de goiaba por Unidade Federativa, 2004

Fonte: Elaborada pelos autores com base em (IBGE, 2005)

            No Estado de São Paulo, a cultura da goiaba foi detectada em 1.687 UPAs (imóvel rural), ocupando 6.323,0 hectares com 1,6 milhão de plantas. Nota-se que houve uma evolução da ordem de 15%, ao comparar esses dados com os do levantamento 1995-96, que totalizou 1,4 milhão de pés em uma área de 5.998,0 hectares. Tendência semelhante foi verificada no Levantamento Subjetivo do IEA/CATI que, em 1996, sumarizou 1,2 milhão de pés contra 1,4 milhão em 2003.
            Identificaram-se três principais regiões produtoras, compostas pelos municípios de Taquaritinga, Monte Alto, Vista Alegre do Alto e Urupês (grupo 1); município de Valinhos (grupo 2); e município de Mirandópolis (grupo 3), bem como os municípios circunvizinhos de até 50 km (figura 2).

Figura 2 – Distribuição geográfica da área plantada com goiaba, 1998-2003 (dados preliminares)

Fonte: Elaborada pelos autores com base em CATI (2003)

            A produção paulista de goiaba é típica de pequenos produtores, inclusive para a finalidade industrial, devido à exigência de constantes podas e de irrigação no caso da fruta para a mesa, o que torna onerosas as grandes áreas. Os pomares do grupo 1 ocupam área de 4.215,4 hectares, em 858 UPAs, e somam o total de um milhão de plantas, participando com 75% da produção estadual, destinada principalmente para a indústria (figura 3).

Figura 3 - Produção de goiaba segundo a finalidade da produção, por grupo, Estado de São Paulo, 2003.

Fonte: Elaborada pelos autores com baseno levantamento IEA/CATI.

            Do total dessa área, cerca de 51% constituem-se de pomares de tamanho entre 2 e 10 hectares e 35%, entre 10 e 50 hectares, enquanto os maiores pomares ocupam áreas de 100 a 200 hectares. Destacam-se os municípios de Taquaritinga e Monte Alto, que apresentam áreas cultivadas próximas a 1.000 hectares, correspondendo a 27% da área total estadual. Essa região tem como vantagem a existência de agroindústrias localizadas nos municípios de Matão, Taquaritinga, Monte Alto e Vista Alegre do Alto.
            A cultura no grupo 2 ocupa área de 806,7 hectares, em 370 UPAs, e atinge o total de 210 mil plantas, participando com 8% da produção estadual, destinada majoritariamente ao consumo in natura (figura 3). Do total dessa área, cerca de 69% constituem-se de pomares de tamanho até 5 hectares, não existindo pomares acima de 50 hectares. No entanto, duas propriedades localizadas nos municípios de Vinhedo e Itu cultivam cerca de 12 mil plantas. O principal município produtor é Valinhos, com 429 hectares, seguido de Campinas com 229,1 hectares.
            Estes municípios próximos à Capital escoam a produção para a Central de Abastecimento S.A. de Campinas (CEASA/Campinas) e para a Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (CEAGESP), de onde é distribuída a feirantes, supermercados, frutarias e outros. Esse grupo possui localização estratégica, por estar próximo a rodovias (Presidente Dutra, Bandeirantes, Anhanguera e Regis Bittencourt), bem como aos aeroportos (Guarulhos, Congonhas, e Viracopos), imprescindíveis para o escoamento rápido do produto por ser uma fruta não-climatérica e altamente perecível.
            No grupo 3, foram constatados 90 mil pés em uma área de 397,4 hectares, em 155 UPAs, que contribuem com 17% da produção estadual, destinada em sua maior parte ao consumo in natura (figura 3). Os tamanhos dos pomares assemelham-se aos do grupo 1, ou seja, maior concentração (57%) nos tamanhos entre 2 e 10 hectares. Contudo, não existem pomares maiores de 20 hectares. O principal município deste grupo é Mirandópolis com 307,0 hectares.
            O espaçamento da goiabeira depende da variedade cultivada. Variedades de porte ereto exigem espaçamentos menores. Entretanto, recomenda-se evitar baixas densidades de cultivo por ser uma planta exigente em clima e solo e, também, adensamentos excessivos devido à execução de inúmeras podas. A densidade usual para a goiaba é entre 150 e 300 plantas/há, ocorrendo variações entre os grupos devido à característica de finalidade da produção de cada um deles (figura 4).

Figura 4 – Percentual de Área com Goiaba por Classe de Densidade de Cultivo e por Grupo, Estado de São Paulo, 2003 (dados preliminares).

Fonte: Elaborada pelos autores segundo CATI (2003).

            O cultivar mais utilizado com finalidade industrial é o Paluma e, para o mercado in natura na região de Campinas e Valinhos, é o Kumagai cuja polpa é branca. Na região de Mirandópolis, os frutos têm por base o grupo Ogawa que veio atender consumidores que preferiam a polpa vermelha.
            A colheita da fruta concentra-se no período de janeiro a março, apresentando declínio no decorrer do ano. Os frutos destinados à indústria são colhidos, em sua maioria, em janeiro e fevereiro e os frutos destinados à mesa, em fevereiro e março (figura 5).

Figura 5 – Percentual de área colhida de goiaba por mês, Estado de São Paulo, 1995-96.

Fonte: Elaborada pelos autores segundo PINO, et al (1997).

            É necessário que o produtor tome algumas medidas, como a irrigação e a aplicação de poda em diferentes épocas do ano, se a intenção é direcionar a produção para o período de menor oferta e oferecer produtos de qualidade não só para o consumidor interno como, principalmente, para os padrões de exportação. Estas medidas são sinais de tecnificação ou modernização do fruticultor.
            Dentre os goiabiticultores, 37% utilizavam conjunto de irrigação em 14% da área no grupo 1; no grupo 2, 55% em 62% da área; e no grupo 3, 36% em 50% da área. No caso dos municípios com as maiores áreas cultivadas, observou-se, na região considerada como produtora para a indústria, que em Taquaritinga a prática de irrigação ocorreu em 10,8% da área total municipal; em Monte Alto, 5,8%; e em Vista Alegre do Alto, 62,5%. Na região considerada produtora de fruta para mesa, como esperado, Valinhos apresentou 80,9% de área irrigada e Campinas, 86%.
            Diante da necessidade de classificação e embalagem da fruta para mesa, foi no grupo 2 que apareceram mais produtores com packing-house (10% da UPAs), enquanto no grupo 1 ocorreu 1% e no grupo 3 não houve ocorrência.
            A maior parte dos produtores de goiaba cultivavam, também, outras frutíferas em seus estabelecimentos. Em 83% das propriedades localizadas no grupo 1, eram cultivados 11.670,6 hectares de citros e, em 39%, a manga ocupava área de 1.855,6 hectares, correspondendo a 8% da área total estadual cultivada com manga. No grupo 2, em 28% das unidades o produtor também cultivava pêssego e em 15%, figo. No grupo 3, a grande maioria possuía pasto (79%) e, em 39% das UPAs, também cultivava-se manga.
            É importante a organização rural do produtor, principalmente do fruticultor que pode usufruir do poder de barganha e de certas práticas comerciais, tais como propaganda e selos de certificação de origem controlada. Quanto às formas de associações, verificou-se que no grupo 1 os produtores eram mais cooperados; no grupo 2, mais sindicalizados; e no grupo 3, mais associados (tabela 1).

Tabela –1 Indicadores sócio-econômicos, produtores de goiaba, Estado de São Paulo, 1998-2003
 

Indicador

 

Grupo 1 
Grupo 2 
Área com goiaba  UPAs  Área com goiaba  UPAs 
(hectare)  Número  (hectare)  Número 
Faz parte de Cooperativas de Produtores 2.719,1  64,5  454  52,9  160,7  19,9  41  11,1 
Faz parte de Associação de Produtores 455,2  10,8  93  10,8  132,5  16,4  43  11,6 
Faz parte de Sindicato de Produtores 1.805,5  42,8  306  35,7  539,9  66,9  237  64,1 
Não utiliza Assistência Técnica 334,4  7,9  74  8,6  177,0  21,9  93  25,1 
Utiliza somente Assistência Técnica Oficial 854,4  20,3  223  26,0  247,9  30,7  116  31,4 
Utiliza somente Assistência Técnica Privada 1.167,8  27,7  180  21,0  200,0  24,8  99  26,8 
Utiliza Assistência Técnica Oficial e Privada 1.858,8  44,1  381  44,4  181,8  22,5  62  16,8 
Utiliza Crédito Rural 1.403,0  33,3  258  30,1  129,5  16,1  63  17,0 
Faz Escrituração Agrícola 1.119,3  26,6  146  17,0  566,9  70,3  211  57,0 
Utiliza Energia Elétrica para as Atvidades Agrícolas 3.366,2  79,9  686  80,0  795,8  98,6  360  97,3 
Utiliza Computador em suas Atividades Agropecuárias 340,3  8,1  32  3,7  125,9  15,6  28  7,6 
Utiliza Técnicas de Conservação de Solo 3.792,7  90,0  745  86,8  573,1  71,0  252  68,1 
Utiliza adubação Mineral 2.900,4  68,8  565  65,9  469,8  58,2  201  54,3 
Utiliza Adubação Orgânica 1.546,3  36,7  313  36,5  481,9  59,7  200  54,1 
Utiliza Adubação Verde 229,9  5,5  44  5,1  213,5  26,5  56  15,1 
Indicador

 

Grupo 3 
Estado 
Área com goiaba  UPAs  Área com goiaba  UPAs 
(hectare)  Número  (hectare)  Número 
Faz parte de Cooperativas de Produtores 99,4  25,0  40  25,8  3.523,7  55,7  662  39,2 
Faz parte de Associação de Produtores 210,6  53,0  73  47,1  1.137,3  18,0  303  18,0 
Faz parte de Sindicato de Produtores 164,6  41,4  53  34,2  2.927,9  46,3  748  44,3 
Não utiliza Assistência Técnica 242,2  60,9  94  60,6  898,5  14,2  343  20,3 
Utiliza somente Assistência Técnica Oficial 128,4  32,3  47  30,3  1.434,6  22,7  492  29,2 
Utiliza somente Assistência Técnica Privada 11,7  2,9  3,2  1.605,3  25,4  340  20,2 
Utiliza Assistência Técnica Oficial e Privada 15,1  3,8  5,8  2.384,6  37,7  512  30,3 
Utiliza Crédito Rural 127,1  32,0  35  22,6  2.072,7  32,8  447  26,5 
Faz Escrituração Agrícola 35,9  9,0  12  7,7  2.282,9  36,1  501  29,7 
Utiliza Energia Elétrica para as Atvidades Agrícolas 354,2  89,1  142  91,6  5.464,7  86,4  1.478  87,6 
Utiliza Computador em suas Atividades Agropecuárias 18,7  4,7  5,2  742,9  11,7  98  5,8 
Utiliza Técnicas de Conservação de Solo 130,9  32,9  47  30,3  5.368,8  84,9  1.274  75,5 
Utiliza adubação Mineral 316,1  79,5  111  71,6  4.164,2  65,9  1.046  62,0 
Utiliza Adubação Orgânica 239,7  60,3  77  49,7  2.655,2  42,0  743  44,0 
Utiliza Adubação Verde 18,3  4,6  5,8  645,4  10,2  164  9,7 
Fonte: Elaborada pelos autores segundo CATI (2003)

            Como toda frutífera, a goiaba é uma planta de alta demanda de nutrientes. Assim, para a obtenção de goiabeiras de alta produtividade, qualidade e com maior longevidade, devem-se realizar práticas corretivas do solo como calagem e adubação. Boa parcela dos produtores está utilizando a prática do uso de adubação orgânica (tabela 1).
            Quanto à escolaridade, de forma geral, os produtores tinham no máximo até o antigo primário completo (74% das UPAs no grupo 1; 61%, no grupo 2; e 66%, no grupo 3). Em 86% das unidades no grupo1, o produtor residia no imóvel; no grupo 2, 76%; e no grupo 3, 87%, o que é consistente com o fato de serem propriedades pequenas e familiares.
            A fruticultura vem contribuindo para aumentar a demanda de mão-de-obra qualificada na agricultura, principalmente no que se refere à poda e à colheita de fruta para mesa. Uma característica dos produtores do grupo 2 é a utilização da mão-de-obra familiar (média de 5 pessoas por UPA). No entanto, no grupo 3 a média de números de familiares que trabalhavam na propriedade era de 2 pessoas por unidade e no grupo 1 era de 3 pessoas.
            Nos principais municípios produtores de fruta de mesa, as propriedades conduzidas por descendentes de imigrantes japoneses correspondem a 43% das UPAs em Campinas e 22% das UPAs em Valinhos. Neste último município, há predominância dos descendentes italianos. Em Mirandópolis, 66% dos produtores de goiaba são nipônicos. A racionalização técnica desta cultura foi introduzida por esses imigrantes no Estado de São Paulo, com excelentes resultados. No grupo 2, também, não houve forte incidência de uso de mão-de-obra temporária (9% das UPAs), comparando-se com os grupos 1 (60% das UPAs) e grupo 3 (32% das UPAs).
            Os resultados apresentados fornecem subsídios relevantes para descrever a cultura da goiaba em São Paulo, bem como para contribuir na explicação das diferenças da cultura e das características regionais. Além disso, estudos de formas de produção de sementes e mudas, classificação dos frutos, controle sanitário e de padronização das embalagens, com o objetivo de se instituir um selo de qualidade para a goiaba brasileira, completam a modernização, beneficiando toda a cadeia de produção.32
 

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1 Exportação de frutas chegam a US$ 370 milhões em 2004. Revista globo rural. Disponível em http://revistagloborural.globo.com . Acesso em 01 de mar. de 2005.

2SECRETARIA DE COMÉRCIO EXTERIOR – SECEX, 2004. Disponível em http://www.mdic.gov.br. Acesso em 01 de mar. de 2005.

3 CEASA Campinas. Disponível emwww.ceasacampinas.com.br. Acesso em 07 de mar de 2005.

4 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA Produção Agrícola Municipal. Rio de Janeiro, 2004. Disponível em www.sidra.ibge.gov.br . Acesso em 05 de março de 2005.

5 COORDENADORIA DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA INTEGRAL Levantamento Censitário de Unidades de Produção Agrícola do Estado de São Paulo, São Paulo: CATI/SAA, 2003 (não publicado).

6 PINO F.A. et al. (Orgs.). Levantamento censitário de unidades de produção agrícola do estado de São Paulo. São Paulo: IEA/CATI/SAA, 1997. 4 v.

7SECRETARIA DE AGRICULTURA E ABASTECIMENTO DO ESTADO DE SÃO PAULO Previsões e Estimativas das Safras Agrícolas do Estado de São Paulo, 1996-2003. Disponível em www.iea.sp.gov.br

8 Op. Cit. 5.

9 Essa característica de pequenos pomares já tinha sido constatada por estudo de VEGRO, C. L. R.; MIRANDA, M. C. Estrutura e dinâmica do mercado de goiaba e derivados Informações Econômicas, SP, v.24, n. 8, p:15-26, ago. 1994.

10 Op. Cit. 5.

11 Op. Cit. 7.

12 Op. Cit. 7.

13 Op. Cit. 5.

14 Op. Cit. 5.

15 Op. Cit. 5.

16 Op. Cit. 7.

17 Op. Cit. 5.

18 Op. Cit. 5.

19 Op. Cit. 5.

20 Op. Cit. 7.

21 Op. Cit. 5.

22 Op. Cit. 5.

23 CASER, D.V.;CAMARGO,ANA M.P.;AMARO,ANTONIO A. Densidades de plantio em culturas perenes na agricultura paulista Informações Econômicas, v.30, no. 7, jul. 2000.

24 Op. Cit. 5.

25 Op. Cit. 6.

26 Op. Cit. 5.

27 Op. Cit. 5.

28 Op. Cit. 5.

29 Op. Cit. 5.

30 Op. Cit. 5.

31 Op. Cit. 5.

32 Artigo registrado no CCTC-IEA sob número HP-17/2005
 
 

Data de Publicação: 16/03/2005

Autor(es): Vera Lucia Ferraz dos Santos Francisco Consulte outros textos deste autor
Celma Da Silva Lago Baptistella (csbaptistella@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Antonio Ambrósio Amaro (amaro.pingo@gmail.com) Consulte outros textos deste autor